entrevistas

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12 de Setembro de 2011
daqui

O diletante e o mestre


Acabei de assistir online a um debate no ETV (Económico.TV, um canal pago sobre assuntos económicos disponível em televisão apenas para aderentes)

Os oradores eram Santana Castilho (como convidado) e Pedro Vassalo * (comentador 'residente' à 2ª feira) e o tema qualquer coisa como "Educação em tempos de troika", ou, por outras palavras, "Os efeitos dos cortes orçamentais no estado da Educação".

Pedro Vassalo
Santana Castilho
Tenho pena de não poder disponibilizar aqui o vídeo do debate. Pena que o não tenham visto mais pessoas, que o não transmitam os canais de serviço público em horário nobre. Santana Castilho esteve SUPERLATIVO! Deu um autêntico baile a um Pedro Vassalo de má dicção, diletante e presumido, 'treinador de bancada' (palavras suas) sobre um assunto de que está positiva e vergonhosamente a leste, que (e, de novo, palavras suas) só conhece na condição de aluno!! Nada que o impedisse (atrevido como qualquer ignorante que se preze) de mandar 'bitaites' sobre o ministério da educação, a escola, os professores, o Parque Escolar! O dito senhor (ver currículo abaixo) trabalha na banca, poderá até perceber imenso do ramo em que exerce funções (calculo que principescamente pagas), mas de Educação e de políticas educativas percebe tanto como o ministro Nuno Crato, que o mesmo é dizer, NADA, um redondo, absoluto zero!
Santana Castilho foi o mestre perante um aprendiz pedante, insuportável como só os ignorantes que pensam que sabem tudo sobre todas as coisas, arrogante e simplório na opção de partir impreparado para debater Educação (como se de um tema menor se tratasse!), ainda por cima com o Homem que sobre o assunto dá cartas em Portugal! E como isso foi, mais uma vez, evidentíssimo, a preparação e o conhecimento dos dossiers, a memória prodigiosa contrapondo números e fontes, a inteligência e a acutilância de um discurso certeiro e limpo, as ideias claras de quem pensa e sabe das coisas.
Não sei se, no fim do programa, PV ficou mais humilde, menos seguro de si. Devia. Vi Santana Castilho aturar-lhe dislate atrás de dislate, como se lhe sobrasse pachorra para o nacional-bronquismo, as frases feitas e as ideias pré concebidas de um consultor de negócios que pouco se distinguiu, no oco palavrar sobre Educação, da tacanha dona de casa que, no último Opinião Pública, brindou quem a ouviu com o estafado slogan à la MST de que 'os professores ganham muito e não fazem nada'.


Alguns exemplos, e a transcrição possível do que se passou no programa:

Partindo da referência de Santana Castilho à 'perversão' matemática destas políticas educativas, em que menos com menos dá, não mais, mas menos - menos escolas, menos professores, psicólogos e outros técnicos de educação, menos apoios - a alunos com deficiência, à aquisição de manuais escolares ou de passes sociais..  e sobre os ditames da troika e além, sobre o cortar despesa em "tudo o que mexe" e que Pedro Vassalo  aprova como inevitável: (cortes)  "possíveis porque imediatos para um governo em funções há apenas 3 meses" [e eu nem vos conto da náusea que me provoca este argumento!] - o que um e outro disseram:
PV: O orçamento do Ministério da Educação vai sobretudo para custos com pessoal, e isso (obviamente) implica despedir professores. --- !!!!!!!!
SC: «Há cerca de 4 mil administrativos em todo o sistema. Por comparação, na Suécia, apenas cerca de 200»
PV: (que "privou com muitos ministros da educação" e foi aluno, por isso crê poder opinar sobre o que se passa no mundo da Educação em Portugal -[a lata desta gente, não?!?!] : «Não há ministro da educação que consiga fazer alguma coisa, porque passa os dias a falar com os sindicatos, são milhares de pessoas!» [ohporfavor!!!!!!!!!!!!!!!!!]
.. e ainda, confundindo professores com líderes sindicais :
«A classe docente  não colabora, nunca colaborou, em qualquer reforma que se faça no ME. Não querem que se corte uma vírgula no seu estatuto!» - [bom, aqui PV passa das marcas! Fique sabendo, caro senhor, que eu, professora, quero mais é que se cortem as vírgulas todas - e os pontos, sozinhos ou em duplo, os de exclamação e interrogação, mais as reticências e as aspas, toda a pontuação deste ECD!! Eu quero é implodir um estatuto que me equipara ao resto da FP apenas para me cortar no salário e em tudo o mais me desfavorece e sobrecarrega!]
Nos antípodas e sem papas na língua, o que consegui anotar das intervenções de Santana Castilho:
«Isto não é uma democracia. É uma falsa democracia. Nós não elegemos um primeiro ministro, votamos num partido, e em Portugal são menos de 4% as pessoas filiadas em partidos. Eu não gosto desta democracia! E não quereria meter as pessoas no Campo Pequeno, mas queria políticos que não fossem apenas técnicos e contabilistas. Queria políticos com alma e coração. Um governo não pode gerir números, tem de gerir pessoas!»
«A maior farsa que se fez neste país a nível educacional foi o programa das Novas Oportunidades.»
«A Parque Escolar foi um expediente para desorçamentar o Estado.»
«O Ministério da Educação é um patrão que não tem vergonha. Anda a contratar há anos milhares de professores a título transitório.»
«O senhor (P. Vassalo) acha que temos de esperar mais tempo antes de criticar as políticas deste governo? Eu ando à espera há 30 anos! Eu, como pagador de impostos, tenho o direito de exigir a quem chega ao governo que saiba ao que vai, que tenha o trabalho de casa feito e aja no dia a seguir a tomar posse!»


Ah, grande Santana Castilho! Assim houvesse mais uns quantos sem vendas nos olhos ou o rabo preso. Assim as pessoas usassem a cabeça para pensar.
Que um serviço público não traduzisse um poleiro. Que as leviandades se pagassem caro e os corruptos fossem parar à prisão, mais ainda se governantes.
E que quem fizesse o que quer que seja o fizesse bem feito ou não o ousasse de todo.
Que quem não percebe nada de Educação se abstivesse de mandar palpites sobre ela. Ou de lhe ocupar o pelouro

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Experiência de Pedro Vassalo (para quem, como eu, nunca antes tenha ouvido falar neste senhor):
  • Director de Negócio Portugal: Novacaixagalicia (Banking industry - March 2011 – present) 
  • Director Portugal - Caixa Galicia (Privately Held; Banking industry, 2000-2011)
  • Analista de Risco de Crédito (Banco Santander - Banking industry, 1996-2000)
  • Auditor-Coopers e Lybrand (Partnership; 10,001+ employees; Banking industry - 1993-1996)
Formação académica de Pedro Vassalo
Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (1988 – 1993)
fonte

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Biografia de Santana Castilho: aqui

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entrevista de SC ao CM, 
3 horas condensadas em 10 minutos:
Santana Castilho:
"Nuno Crato não sabe o que é uma escola"
Professor defende que o ministro da Educação começou "o reinado como um autêntico palhaço da avaliação do desempenho" dos professores e fala em impreparação.
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Por:Janete Frazão / João Pereira Coutinho

xl.pt/detalhe/noticias/nacional/ensino/nuno-crato-nao-sabe-o-que-e-uma-escola
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 in Profblog - 8 de Maio de 2011 - aqui


entrevista de Ramiro Marques: 

A propósito da publicação do livro O Ensino Passado a Limpo (Porto Editora), prefaciado por Pedro Passos Coelho, o ProfBlog quis ouvir Santana Castilho sobre as medidas para melhorar a qualidade do serviço educativo.

ProfBlog - A assinatura do prefácio ao livro por Pedro Passos Coelho pode ser interpretada como um apoio do líder do PSD às propostas nele incluídas?

Santana Castilho - Pode. Mas é melhor ler o prefácio.

ProfBlog - Pode indicar quais são as cinco medidas prioritárias que propõe no livro?

Santana Castilho - (1) Assumir a definitiva e total autonomia das escolas. O paradigma tradicional de gestão do sistema está esgotado. O poder tem que confiar nos professores e entregar-lhes a responsabilidade efectiva de gestão das suas escolas. Como corolário óbvio, serão extintas as direcções regionais de educação e proceder-se-á à adequação consequente da estrutura orgânica do Ministério da Educação. As valências centrais limitar-se-ão à definição das políticas de natureza nacional, à supervisão, ao controlo da qualidade e aos instrumentos de avaliação e relativização dos resultados. Deste enunciado genérico emana a imperiosa necessidade de despolitizar todos os serviços técnicos. Há que ganhar uma estabilidade de funções, que persista para lá das mudanças dos políticos, protegendo a administração superior da volatilidade política.

(2) Reformar a legislação vigente depois de a reduzir ao essencial e republicá-la livre do carácter prolixo e indecifrável que a caracteriza. Em Portugal legisla-se muito e mal. Mas o expoente máximo do dilúvio legislativo reside nos normativos que regulam a administração da Educação. Não se trata de prosseguir na mesma via. Trata-se de extrair o necessário do que se encontra publicado e de o ordenar em códigos temáticos que possam ser usados e facilmente entendidos por todos. E trata-se, depois, de mudar a cultura organizacional, pondo cobro à demência legislativa e tornando a estabilidade norma.

(3) Conceber um modelo de avaliação do desempenho docente que obedeça aos seguintes princípios: o quadro legal que venha a ser definido tratará autonomamente a avaliação do desempenho e a classificação do desempenho; o modelo de avaliação e classificação do desempenho será desenvolvido com a colaboração estreita dos actores a quem se destina, substituindo a lógica da imposição pela lógica da aceitação; o modelo de avaliação e classificação do desempenho das escolas e dos professores será sujeito a um sério escrutínio técnico, de natureza pedagógica e científica, por parte das associações representativas da comunidade educativa, de modo a garantir-lhe credibilidade e exequibilidade; o modelo de avaliação e de classificação do desempenho não será universal, isto é, não será o mesmo para contextos científicos e pedagógicos diferentes; a avaliação do desempenho privilegiará o desempenho da Escola, enquanto somatório do desempenho dos seus actores; a avaliação do desempenho dos docentes far-se-á tendo como referencial obrigatório o quadro de desenvolvimento da escola a que o docente pertence e não uma multiplicidade de percursos e objectivos individuais dos docentes que a integram; a avaliação do desempenho visará a gestão do desempenho, isto é, terá como resultado prioritário a determinação dos obstáculos ao sucesso do ensino e a sua remoção, numa lógica formativa; a classificação do desempenho referir-se-á a ciclos temporais bem mais dilatados que o anual, manifestamente insuficiente para gerar alterações observáveis relevantes e de forma a não supor cargas incomportáveis de procedimentos administrativos, sendo que, no que toca a consequências na progressão na carreira dos docentes, tais ciclos temporais serão os da duração de cada escalão profissional; a classificação do desempenho revestirá uma lógica externa preponderante, removendo definitivamente da cultura organizacional das escolas os malefícios da classificação inter-pares; a avaliação e a classificação do desempenho serão consequentes, num quadro de correspondência bem definida entre autonomia e responsabilidade; a avaliação e a classificação do desempenho passarão a constituir referenciais dominantes da acção de supervisão formativa da Inspecção-Geral da Educação e instrumentos axiais de uma política de garantia da qualidade do ensino.

(4) Alterar o modelo de gestão das escolas, compatibilizando-o com o novo paradigma de autonomia, devolvendo-lhe a democraticidade perdida, adequando a natureza dos órgãos às realidades sociais existentes e abandonando a lógica concentradora do poder num só órgão.

(5) Auditar do ponto de vista financeiro, pedagógico e científico o programa Novas Oportunidades. Reapreciar e reformar os programas EFA E CEF.

ProfBlog - Confirma a sua participação na elaboração do programa eleitoral do PSD para a Educação?

Santana Castilho - Confirmo

ProfBlog - O seu livro coloca a nu a fragilidade das políticas educativas dos últimos seis anos. Pode indicar quais foram as três medidas mais gravosas?

Santana Castilho - A imposição do modelo de avaliação do desempenho, a alteração do regime de gestão das escolas e toda a política de rede escolar, conducente à criação dos mega agrupamentos.

ProfBlog - Quais as três primeiras medidas educativas que o próximo governo deve tomar?

Santana Castilho - As 3 primeiras das 5 anteriormente citadas.



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sobre os resultados PISA 2009



Respostas ao semanário “Sol”

jornalista Margarida Davim
8 de Dezembro de 2010


Qual é a importância de um estudo como o PISA?
O PISA reflecte a preocupação do organismo que o promove que, recordo-lhe, não tem a educação por escopo, mas sim a economia. O PISA fica-se pela tentativa de medir conhecimentos básicos e de natureza utilitarista. Sugiro-lhe que procure conhecer o conteúdo dos testes ministrados. Ficará surpreendida. Felizmente que os programas de formação dos jovens de 15 anos contemplam dimensões a que o PISA não atende. A grande importância do PISA não está no seu valor intrínseco, mas na influência que exerce sobre as políticas educativas, orientando-as para os resultados, com notório menosprezo pelas vertentes humanistas e culturais do acto educativo. As orientações da OCDE são redutoras, mas têm vindo a ser aceites com uma preocupante atitude reverencial por parte dos decisores políticos.


Portugal subiu nas três áreas avaliadas. Como se explicam estes bons resultados? Que medidas podem ter contribuído para um melhor desempenho dos alunos portugueses nas provas PISA?
Como professor e como português regozijo-me com os resultados. Mas relativizo-os porque conheço a realidade, bem diferente daquilo que muitos deles inferem. Afinal estamos a festejar 489 pontos em 698 possíveis. É pobre como desígnio.
Nada no estudo permite, com rigor, estabelecer as correlações que têm sido adiantadas. As explicações serão sempre especulativas. Consciente disso, entro no jogo e faço os seguintes comentários:

- Quem está no terreno sabe que os piores alunos saíram do universo onde os testes foram aplicados. Os cursos de educação e formação e o impropriamente chamado ensino profissional operaram uma oportuna “limpeza” do sistema.
- Sugiro-lhe, como jornalista, que investigue a metodologia de constituição da amostra utilizada. Pessoalmente, depois de ter assistido às mais grosseiras manipulações estatísticas de que guardo memória por parte deste e do anterior Governo, não confio e gostaria de ver o processo sindicalizado.
- No caso da Matemática, certamente que o aumento do número de horas consignado à disciplina terá tido relevância.
- No caso do domínio da leitura, fico perplexo quando cruzo a melhoria apurada pelo PISA em 2009 com os resultados dos exames de Português do 9ºano, igualmente de 2009, que registaram um acentuado abaixamento de nível (83,2% de negativas em 2009, quando em 2008 foram 69,9%).

          Um especialista da OCDE associou estes resultados à avaliação do desempenho dos professores e às reformas levadas a cabo em Portugal. Concorda com esta análise?
          É uma análise lamentável, da qual discorda qualquer cérebro que funcione. Justifico sem ser exaustivo:
          - Andreas Scheicher, pois é dele que se trata, admite que os resultados se devam em primeiro lugar às políticas dos últimos anos. Os testes do PISA foram ministrados em 2000, 2003, 2006 e 2009. Em cada ano privilegiaram uma das dimensões consideradas. Em 2000 o enfoque prioritário foi na leitura, como voltou a ser em 2009. Ou seja, a evolução ocorreu entre 2000 e 2009, mas Andreas não explica por que saneia os anos iniciais.
          - Andreas Scheicher diz o mesmo do plano de Matemática e da avaliação dos professores. Não se deu conta que os alunos a que os testes de 2009 foram aplicados não foram actuados pelo plano de Matemática. Nem sabe que, independentemente da mediocridade do modelo de avaliação dos professores, o mesmo não foi simplesmente aplicado.
          - Andreas pertence aos tecnocratas que endeusam a econometria. Principescamente pagos e a coberto de organizações seguidas com reverência, debitam opiniões sobre coisas que não conhecem. Lembra-se do “triple AAA” que as agências de “rating” davam ao Lehman Brothers na véspera de falir? Lembra-se do que a OCDE dizia do sucesso da Irlanda?
           O PISA assenta nos testes que administra e nos relatórios e estatísticas que os governos lhes fornecem. Com toda a mentira e manipulação que possam conter.
          Lembra-se daquele relatório encomiástico encomendado por Maria de Lurdes Rodrigues a peritos da OCDE e que Sócrates apresentou inicialmente como sendo da organização?
          As fontes documentais eram todas do Ministério da Educação. Nem uma dos milhares de páginas que se escreveram, em oposição à política do governo, mereceu a atenção dos peritos. A informação de enquadramento foi um relatório preparado para os peritos pelo Ministério da Educação. Os peritos não se deixaram enquadrar por nenhum dos livros publicados no período sobre as matérias em análise, por nenhum documento produzido em sede da Assembleia da República ou Conselho Nacional da Educação, por exemplo, associações científicas, profissionais ou sindicais, muito menos por dados estatísticos que tenham escapado às matrizes oficiais. Passaram 6 dias em Portugal. E nesses seis dias tiveram tempo para fazer 14 reuniões, ouvirem 58 pessoas e viajarem pelo país em visita a 10 escolas. As pessoas com que se encontraram são altos quadros do Ministério da Educação. As câmaras municipais inquiridas eram do PS.
          Esta é a metodologia habitual da OCDE.

          Que resultado destacaria neste estudo?
          Prejudicada pelas respostas anteriores.

          O rácio professor/aluno também é avaliado positivamente. Concorda com esta nota positiva?
          Uma coisa é a dimensão das turmas, outra coisa é dividir o número de alunos do sistema pelo número de funcionários do Ministério da Educação, com a categoria de professores. Neste cômputo entram os milhares que estão em funções administrativas e não dão aulas. Como alguém dizia com graça, há as mentiras graves, as que não têm importância e a estatística.

          No estudo refere-se que os professores portugueses são dos que mais ganham relativamente ao PIB nacional. Os docentes são bem pagos no nosso país?
          Remeto-a para a própria OCDE e para a sua publicação de referência, “Education at a Glance, 2010”. Lá poderá ver que os professores portugueses trabalham, em média, mais 83 horas por ano que os seus colegas da OCDE, têm uma carga horária superior, seja qual for o nível de ensino considerado, e ganham menos em todos os escalões, excepto no topo da carreira. Mas para lá chegarem esperam mais 7 anos que a média dos professores da OCDE.

          Santana Castilho, 8 de Dezembro de 2010


          aqui - "PISA: mentiras, perplexidades e factos" 
           
          aqui - Santana Castilho no 'Opinião Pública' de 7 de Dezembro

          e ainda: "O estado comatoso do ensino em fim de ciclo político" - aqui
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          A Dessacralização da Avaliação do Desempenho
          Santana Castilho
          Universidade Lusíada, 20 de Março de 2009 - retirado daqui

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          As ideias que passo a submeter à vossa atenção pretendem, sobretudo, incentivar o debate. Mais do que as minhas palavras, será a troca de opiniões e o exercício do contraditório que poderão trazer algo de novo a uma discussão que, perversamente, tem afastado a Escola da sua missão por excelência: ensinar.

          Pretendo defender a ideia de que a Avaliação do Desempenho, tal como a conhecemos, como conceito preponderante na gestão moderna, sistematizada e enquistada em modelos, vem sendo aceite como os crentes aceitam os dogmas, isto é, com reverência sacra.
          Pretendo defender a ideia de que a Avaliação do Desempenho, tal como sumariamente a acabo de invocar, poderá servir as organizações que tenham por objecto a produção de bens facilmente tangíveis, mas não servirá as instituições cujo fim é formar a pessoa integral.
          Pretendo defender a ideia de que não há almoços grátis. Ou, dito doutro modo, afirmar a convicção de que as sucessivas modas em Gestão, de que a Avaliação do Desempenho é paradigma, se têm pré-ordenado para transformar a economia de mercado, que não me aquece a alma, na sociedade de mercado, que me gela as entranhas.
          Pretendo defender a ideia de que tudo isto, e tudo isto é a Avaliação do Desempenho, Bolonha, Novas Oportunidades, Magalhães e todo o restante cortejo de fancaria, é tão-só o corolário de uma atitude cívica de passividade perante uma pseudo inevitabilidade que dá pelo nome de globalização. Estas defesas, repito, reservo-as para o debate.

          A exposição que o introduz e ora submeto ao vosso critério obedece a três vertentes: a primeira procurará sintetizar as características de uma sociedade globalizada, que sacralizou a Avaliação do Desempenho; a segunda referirá, em síntese, alguns dos aspectos mais relevantes da entrada bruta do fenómeno na Escola; a terceira fará uma brevíssima crítica à tessitura entre as duas anteriores.

          Em linguagem corrente, diz-se global tudo o que pode ser considerado em globo, isto é, em conjunto. Mas o termo globalização colhe a sua justificação num modismo dos muitos com que a Economia nos brindou, enquanto actividade e arte de “prever e planear, organizar, dirigir, coordenar e controlar”.

          Os primeiros indícios de uma nova moda em Economia aparecem sempre através de uma poderosa máquina comunicacional montada por gurus milionários. Essa máquina global encarrega-se de invadir os “media” com notícias e artigos evidenciadores das melhorias que a teoria moderna introduz na actividade das organizações. À sua sombra, e servindo-a na secular lógica parasitária, despontam de imediato legiões de consultores que lhes ampliam os ecos em sucessivas ondas de êxitos anunciados. E quando o processo claudica face à linguagem incontestável dos resultados, já outra moda domina, na voracidade efémera do consumo. Eis o berço da Avaliação do Desempenho!

          Terá o fenómeno conhecido por globalização as características dos modismos a que acabo de aludir? Na sua essência, admito tratar-se de algo mais vasto e real, com contornos identificáveis numa pluralidade de áreas da actividade humana, fruto de uma determinada evolução da sociedade em que vivemos. Mas na forma como o fenómeno nos quer ser imposto, qual via única de futuro, reconheço uma tendência totalitária a que respondo, na teoria e na prática, com o direito a ser diverso no pensar e no agir. Porque o mundo é global e vário, uniforme e multiforme. Por globalização entende-se a tendência cada vez mais acentuada para as empresas mudarem o seu teatro de operações para zonas geográficas e culturais mais vastas, procurando beneficiar de uma série evidente de economias de escala. Entre outras causas, os estonteantes progressos das tecnologias de comunicação foram determinantes para a abertura de fronteiras e a instalação da lógica da livre circulação de produtos, serviços, capitais e recursos humanos. Mas um olhar atento para o fenómeno descrito revela-nos que as suas consequências imediatas, isto é, o incremento da comodidade de vida e da riqueza dos mais industrializados, deixa de fora dois terços da população do mundo, para cuja superação de dificuldades nada disto se orienta. No que toca à medição de riscos de impacte social e ambiental, que a longo prazo semelhante desequilíbrio provoca, não diviso preocupações actuantes. E, no entanto, o mundo mostra-se desnorteado e as economias de papel ficaram atarantadas com os recentes escândalos financeiros.

          A perplexidade que assim manifesto é ainda maior ante o antagonismo dos actuais dinamismos sociais: se por um lado o mundo se torna cada vez mais ao alcance de todos, globalizando-se, por outro são cada vez mais acentuadas as tendências para o segmentar e dividir. Atente-se, a este propósito, à pujança de diferentes fundamentalismos, enquanto nos tradicionais partidos políticos ocidentais se esbatem e igualizam as ideologias e se assiste à dissolução da família e dos nossos seculares valores de referência.
          Tenha-se presente, a título de mero exemplo, que na América do Sul são mais de uma centena os grupos linguísticos perfeitamente diferenciáveis, que na pequena e conturbada Guiné-Bissau se falam cerca de 50 crioulos e que, em África, o número de idiomas supera o de qualquer outro continente.
          Não percamos de vista a desagregação política da ex-União Soviética, marcada pela presença de 104 etnias diferentes.
          E recordemos, ainda, o recente drama da desaparecida Jugoslávia e os horrores da Irlanda, do País Basco, do Uganda, do Sudão e do Iraque. Numa palavra, o corolário infindável de uma realidade que nenhuma globalização resolveu: apenas 10 por cento das nações são etnicamente consistentes.

          As nações afastam-se enquanto as economias se aproximam, conduzidas por um pequeno núcleo de colossos empresariais globais, mais poderosos que a maioria dos próprios estados. A sua actividade assenta no domínio de uma rede bancária global e tem por lógica globalizar as necessidades e os gostos, usando, entre outros artifícios, matrizes tipificadas de Avaliação do Desempenho, que reduzem culturas e contextos díspares à mesma escravatura de resultados.

          Face ao anterior, a grande incógnita reside no futuro. Sem especulações, parece-me desde já evidente que a evolução dos países do ex-bloco comunista (cerca de um terço da população da terra) e o comportamento da economia chinesa (cerca de um quarto dessa população) serão determinantes, como determinantes serão as políticas seguidas para resolver os grandes problemas dos países industrializados, de que a segurança social, o desemprego e a conservação do ambiente, com particular destaque para a gestão dos recursos hídricos, são exemplos. O quadro descrito convida-nos, pois, a uma reflexão menos eufórica sobre as virtudes da globalização ou sobre a sua verdadeira projecção no mundo.

          Parece-me evidente que a economia de mercado não se tem mostrado adequada à regulação da economia, ou pelo menos à orientação dessa pela via que me interessa, a humanista. O intervencionismo estatal e os proteccionismos centralizados tão-pouco se afiguram adequados e a história económica mostra-o. Naturalmente que muitos dirão que estes são conceitos que não casam, a economia e o humanismo. Mas penso que no seu tratamento conjunto reside o grande desafio do terceiro milénio.

          Aqui, como em muitas outras áreas fulcrais da vida, temos tido tendências, assumidas ou dissimuladas, para enquistarmos em modelos. Os teóricos têm uma propensão monstruosa para nos resumirem a modelos e tudo gerir com a sua aplicação. Talvez que a Escola do terceiro milénio se deva preocupar com a implosão dos modelos que espartilham o Homem.
          Aliás, e naquilo de que estamos a falar, o novo modelo, o da globalização, pode conduzir-nos ao caos. Números disponíveis são indiciadores da orientação da economia para objectivos ambiental e socialmente insustentáveis. O “Relatório do Desenvolvimento Humano” que a este propósito compulsei, deixa-nos perplexos. Lá se constata que mais de 1.000 milhões de pessoas não têm possibilidade de satisfazerem as suas necessidades básicas; que 85 por cento da riqueza mundial é detida por 23 por cento da população e que a barreira entre os ricos e os pobres duplicou nas últimas 3 décadas; que 1 bilião de pessoas não tem água potável, 2 biliões vivem sem saneamento básico, 2 milhões morrem de sida todos os anos, 940 milhões de adultos são iletrados e 175 milhões estão emigrados.

          Uma nota extremamente curiosa que o relatório permite estabelecer é que a liberalização é mais retórica que facto. Com efeito, 83 por cento dos países industrializados são hoje mais proteccionistas que há 10 anos. Por via disso, os países em desenvolvimento perdem anualmente qualquer coisa como 395.000 milhões de euros (10 vezes mais do que recebem em ajudas).
          Os números relativos à demografia e á preparação de quadros são também extremamente significativos. Assim, 80 por cento da população mundial está no sul. Mas aí, apenas 9 por cento em cada 1.000 habitantes tem preparação técnica, contra 81 em cada 1.000 no norte. Mais de 1 milhão de técnicos altamente qualificados, oriundos de países em desenvolvimento demandaram os Estados Unidos da América ou o Canadá nas últimas 3 décadas.
          O quadro sugerido pela sinopse descrita é, no mínimo, perturbador e afigura-se insustentável. O fosso entre o norte e o sul, entre ricos e pobres, tem de ser atenuado. Um bom princípio seria a redução das despesas com armamento, donde resultaria uma poupança da ordem dos 1,5 biliões de dólares por ano. Aqui têm a singela avaliação do desempenho dos senhores do mundo, sem necessidade de outro descritor que não seja a miséria humana.

          Aqui chegados é tempo de apreciarmos, em sinopse, como a lógica reducionista do utilitarismo e dos resultados a qualquer preço chegou à Escola, sob a forma da Avaliação do Desempenho. Como sabemos, não é verdade que, durante 30 anos, não tenha havido avaliação do desempenho dos professores, ou que os professores não queiram ser avaliados.
          A questão reside na substituição de um modelo ineficaz, o que existia, por outro, escabroso, o que se propõe, que, se se consumar, trará mais caos ao caótico sistema de ensino. Nenhuma organização séria, seja pública ou privada, propõe mudar seja o que for, neste quadro, sem permitir (e mais que isso, fomentar e promover) o envolvimento dos visados na construção do processo. A avaliação do desempenho só vale a pena se for concebida como instrumento de gestão do desempenho. Quer isto dizer que o seu fim primeiro é identificar obstáculos ao desenvolvimento das organizações, removendo-os e não castigar pessoas.
          Aliás, sem com isso pretender diminuir a importância da avaliação do desempenho, sempre recordarei a abundância de estudos e reflexões teóricas que sublinham as perversidades que a avaliação do desempenho introduz nos processos, circunstância que tem deslocado a ênfase para a cultura organizacional. Dito doutro modo, as instituições maduras preocupam-se hoje mais com a apropriação por parte dos colaboradores dos valores que intrinsecamente geram o sucesso e melhoram o desempenho, que com os instrumentos que, extrinsecamente, o promovem.
          A qualidade do desempenho profissional dos professores é uma das variáveis que contribuem para a qualidade da formação dos jovens e que, por isso, deve ser seriamente considerada na gestão da educação. Mas antes dele abundam muitas outras, que nem a Escola nem os professores podem controlar. Lembro algumas, sem as esgotar: baixos níveis de literacia dos progenitores, com a consequente impossibilidade de continuarem em casa o trabalho da Escola; empobrecimento das famílias (2 milhões de pobres e 2 milhões de assistidos), num cenário de crescente aumento das desigualdades económicas e sociais, que favorecem o abandono precoce do estudo em busca de trabalho, ainda que mal pago; desvalorização do papel social da Escola, numa sociedade onde a posse de uma formação longa é cada vez menos garantia de acesso ao trabalho remunerado (fala-se sempre da Escola formar para o desemprego, nunca se fala da economia não gerar empregos suficientes para todos); universalização do emprego precário e aumento do desemprego; políticas urbanísticas inadequadas, geradoras de guetos étnicos e socioeconómicos propiciadores de exclusão e de marginalidade; aceitação e promoção de um paradigma de vida em que a Escola deve substituir os pais (escolas básicas a abrir das 07.00 às 19.00 e secundárias a guardar os jovens 50 horas por semana, em nome de um estranho conceito de escola a tempo inteiro).

          Outras variáveis, directamente actuáveis pela gestão educacional, permanecem intocáveis ou sofreram intervenções degradantes: planos curriculares e programas disciplinares; orientações metodológicas; prestações exigíveis aos alunos e seu estatuto disciplinar; modelo de gestão das escolas; políticas de formação inicial e continua dos professores; estruturas de supervisão; políticas de rede escolar e de modernização de equipamentos.

          No meio de tudo isto, a avaliação do desempenho está longe de ter o impacto que muitos lhe atribuem. Mas vamos a ela e falemos dos erros que subjazem ao decreto que a regulamenta, sob a forma de perguntas que endereço aos que apoiam a ministra da Educação e denigrem os professores:
          Onde está a evidência mínima, a simples presunção fundamentada, ao menos, em experiências similares, que, cumprido o proposto, os resultados dos alunos melhorariam? Que países, daqueles que servem habitualmente de referência aos arautos da modernidade, ou outros, puseram em prática modelos similares e que resultados foram obtidos? Que análise custo - benefício fizeram os arquitectos do monstro, antes de o parir? Quanto custa observar 3 aulas por ano (pelo menos, como manda a lei) multiplicadas pelo número de professores a avaliar?
          Surpreendem-se se adiantar que, só para isso, estaremos a falar de qualquer coisa como 700 salários anuais de professores de topo de carreira? Quanto tempo e quanto custa preencher a loucura de fichas e papéis que o sistema supõe? Não é verdade que, entre outras, sublinho, entre outras, teremos uma ficha de objectivos individuais, uma ficha de auto avaliação do avaliado, uma ficha de avaliação de um avaliador (coordenador do departamento), outra ficha de avaliação de outro avaliador (presidente do Conselho Executivo), uma ficha de observação de aulas, uma ficha de avaliação do portefólio do avaliado e o próprio portefólio do avaliado? Poderão e deverão as escolas dedicar um tempo desproporcionado à avaliação dos professores, tempo que retirarão ao ensino, missão primeira da Escola? Não é verdade que poderemos ter licenciados a avaliar doutorados? Não estamos, por essa via, a envenenar irremediavelmente o clima relacional entre os docentes, já perigosamente aviltado pela grosseira injustiça que dividiu professores em titulares e outros? Não é verdade que se reduziu ao ridículo a tradicional lógica dos saberes instituídos, quando poderemos ter um professor de Biologia a avaliar um colega de Matemática ou um de Física a perorar sobre o desempenho doutro de Informática? Não será aberrante um biólogo ir observar a aula de um matemático? Não é inaceitável que a ministra argumente que todos os professores avaliadores estão preparados para avaliar colegas, já que toda a vida avaliaram alunos, como se a supervisão pedagógica fosse simples diletância de universitários lunáticos? Não teremos um conflito insanável de interesses quando avaliando e avaliador podem ser concorrentes a uma mesma menção de “excelente” e o segundo pode driblar o primeiro, esgueirando-se pela porta estreita das quotas?
          Não é certo que o sucesso dos alunos é muito mais provável numas disciplinas que noutras? Não é verdade que a avaliação externa não se aplica a todas as disciplinas? Como aceitar que a inteligência diferente dos alunos, a sua aplicação e interesse, as deficiências transitadas de anos anteriores, por exemplo, possam rotular o trabalho dos professores, ao menos sem um acurado mecanismo ponderador? Como indexar, assim, parte da classificação dos docentes a critérios tão vulneráveis? Como negar que a curta história do diploma em apreço seja a macabra história de comportamentos continuados de desrespeito da própria lei por parte dos seus autores, como a insensatez das datas, a não regulamentação do essencial e a trapalhice continuada para salvar a face suja?

          As perguntas que ficam não são mera retórica. São a evidência de um sinistro disparate. E como a epígrafe da minha intervenção nos remete para o sacro e vai longa, permitam-me que termine a alusão à segunda vertente que vos anunciei com recurso a uma daquelas muitas mensagens que nos chegam pela internet, sem anúncio nem parcimónia de entrada. Esta vinha sem autoria identificada, que por isso não cito, mas constitui uma bela rábula à Avaliação do Desempenho que a indigência intelectual quer impor às escolas e aos professores. Reza assim:

          Naquele tempo, Jesus subiu ao monte seguido pela multidão e, sentado sobre uma grande pedra, deixou que os seus discípulos e seguidores se aproximassem. Depois, tomando a palavra, ensinou-os dizendo: em verdade vos digo, bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados; bem-aventurados os misericordiosos, porque deles...

          E Filipe lamentou-se:
          Mas eu não trouxe o papiro-diário, Mestre.
          E Bartolomeu quis saber:
          - Temos de tirar apontamentos?
          E João levantou a mão:
          - Posso ir à casa de banho?
          E Judas exclamou:
          - Para que é que serve isto tudo?
          E Tomé inquietou-se:
          - Há fórmulas? Vamos resolver problemas?
          E Tadeu reclamou:
          - Mas... porque não nos dás a sebenta e... pronto?
          E Mateus queixou-se:
          - Eu não entendi nada! Ninguém entendeu nada!
          Um dos fariseus presentes, que nunca tinha estado diante de uma multidão nem ensinado coisa alguma, tomou a palavra e dirigiu-se a Jesus, dizendo:
          - Onde está a tua planificação?
          - Qual é a nomenclatura do teu plano de aula nesta intervenção didáctica mediatizada?
          - E a avaliação diagnóstica?
          - E a avaliação institucional?
          E antes de concluir, Pedro o interrompeu:
          - Temos que aprender isso de cor?
          E André disse:
          - Temos que copiá-lo para o caderno?
          E Tiago perguntou:
          - Vamos ter teste sobre isso?
          - Quais são as tuas expectativas de sucesso?
          - Tens para a abordagem da área uma formulação globalizada, de modo a permitir o acesso à significação dos contextos, tendo em conta a bipolaridade da transmissão?
          - Quais são as estratégias conducentes à recuperação dos conhecimentos prévios?
          - Respondem estes aos interesses e necessidades do grupo, de modo a assegurar a significatividade do processo de ensino-aprendizagem?
          - Incluíste actividades integradoras com fundamento epistemológico produtivo?
          - E os espaços alternativos das problemáticas curriculares gerais?
          - Propiciaste espaços de encontro para a coordenação de acções transversais e longitudinais que fomentem os vínculos operativos e cooperativos das áreas concomitantes?
          - Quais são os conteúdos conceptuais, processuais e atitudinais que respondem aos fundamentos lógico, praxeológico e metodológico constituídos pelos núcleos generativos disciplinares, transdisciplinares, interdisciplinares e metadisciplinares?
          Caifás, o pior de todos, disse a Jesus:
          - Quero ver as avaliações do primeiro, segundo e terceiro períodos e reservo-me o direito de, no final, aumentar as notas dos teus discípulos, para que ao Rei não lhe falhem as previsões de um ensino de qualidade e não se lhe estraguem as estatísticas do sucesso. Serás notificado em devido tempo pela via mais adequada. E vê lá se reprovas alguém! Lembra-te que ainda não és titular e não há quadros de nomeação definitiva.

          E Jesus pediu a reforma antecipada aos trinta e três anos...


          Concluirei, como proposto, com brevíssimas linhas críticas ao relacionamento entre a sacrossanta Avaliação do Desempenho e a pagã forma pós-moderna de ver a sociedade globalizada. Os senhores do dinheiro, os sacerdotes dos resultados a 500 euros de salário, têm-se apossado, paulatinamente, de tudo o que reflectia e questionava. Sob o manto diáfano de Bolonha, entraram nas nossas universidades. Apearam a procura livre e autónoma do saber e colocaram no altar os resultados. O seu desígnio é transformá-las em sucursais empresariais devidamente uniformizadas. Nesta lógica, a avaliação do desempenho premeia os que fazem certo e castiga os que fazem bem. Esclareça-se que fazer certo é venerar o dogma, fazer bem era autonomizar as pessoas. Desceram às escolas básicas e secundárias. Transformaram-nas em casernas abertas 12 horas por dia e chamaram-lhe escola a tempo inteiro. Encaixotaram a Filosofia, a História e a Literatura, que não queimaram, por enquanto. Meteram os ciganos em contentores sob a epígrafe de “caso intermédio de integração”. Chamaram a polícia quando foi preciso. Em nome da Avaliação do Desempenho, burocratizaram criminosamente e escravizaram com trabalho inútil.

          Entendamo-nos. Desde sempre, todos os chefes competentes e todos os chefiados honestos concordaram com a necessidade de avaliar para gerir bem. Mas dificilmente alguém me convencerá de que é útil aplicar medidas de desempenho estereotipadas, normalizadas e gerais a tudo o que é diverso. Ou que se pode tudo medir e tudo indexar a resultados. É esta cultura de avaliação que contesto. É a relevância que se lhe atribui que repudio. É a passividade da sociedade face a esta versão moderna de fascismo que me preocupa.

          A Escola é por excelência um lugar de cooperação. Um ano bastou para a transformar na antecâmara duma competição mal sã. Meia dúzia de grelhas de avaliação do desempenho que me foram dadas a examinar, conducentes à atribuição da menção “excelente”, deixaram-me arrepiado por tipificarem tudo o que um professor não deve ser. Mas houve comissários suficientes, “boys” e “laranjas”, do centralão imenso em que as escolas se podem transformar que as conceberam. Na génese até desta crise global imensa e nunca vista em que todos estamos mergulhados, que podemos encontrar? A lógica da Avaliação do Desempenho dos seus responsáveis. Terei muito gosto em o concretizar e clarificar no debate que se seguirá.

          A sociedade que caracterizei na primeira parte desta exposição é a da globalização. Bento XVI comparou-a recentemente à Torre de Babel e apelidou-a de “névoa que cega as nações”. A escola que nos estão a impor serve acefalamente essa sociedade e visa o homem sem humanidade. É dever social dos professores fazerem uso da arma poderosa que é a palavra para promoverem a utopia de hoje a realidade de amanhã, isto é, a mudança radical da ordem económica vigente, mudança essa que permitirá, e cito uma vez mais o Papa, “preferir o bem comum de todos ao luxo de poucos e à miséria de muitos”.



          *


          IOL.pt, aqui
          09/04/2010

          Santana Castilho, professor do Ensino Superior e especialista em gestão educativa, acredita que o que levou ao suicídio o professor José António Martins, de Vouzela, foi um prolongado processo de assédio moral, que este especialista considera ser a vertente dominante da actual gestão educacional, dita moderna. Em declarações ao tvi24.pt, Santana Castilho reitera o que já tinha escrito na coluna que assina no jornal «Público»: «as escolas foram-se transformando em locais de subjugação, de vivência dolorosa e inútil, pequenas ilhas de tirania».

          Nos casos extremos do professor Luís, de Sintra, e de José António Martins, de Vouzela, que Santana Castilho averiguou pessoalmente, a escola acabou por ser local de «tortura e de morte». «Há uma relação de causa-efeito entre as políticas seguidas e o acumular de estados depressivos dos professores», assegura ao tvi24.pt.

          De José António Martins, Santana Castilho diz que «era um professor normalíssimo com uma vida normalíssima que entrou num processo de depressão porque os superiores lhe exigiam uma carga de trabalho que não podia suportar e lhe pediam responsabilidades sobre o que era humanamente impraticável». José António Martins «tinha uma consciência moral forte que o levava a sentir que o que estava a fazer não servia absolutamente para nada e que participava num ludíbrio», refere.

          Santana Castilho explica que «se está a criar um drama nas escolas, uma cascata de efeitos sociais». «A pressão insuportável para promover artificialmente resultados, a incerteza crescente que caracteriza as relações de trabalho e a sua galopante desumanização, promovida por dirigentes sem alma, estão a destruir a escola pública», defende.

          «O conceito de escola a tempo inteiro, com uma carga horária de 35 horas semanais, actividades escolares ao sábado e ao domingo que não encontram contrapartida nas remunerações salariais, um Estatuto do Aluno pré-ordenado para que os estudantes passem sem saber, um processo de gestão das escolas que saiu completamente do controlo dos professores são realidades que causam problemas terríveis a quem é sério», acrescenta.

          Para Santana Castilho, «a corrupção da avaliação educacional, de que a avaliação individual de desempenho docente é o clímax, gerou medo, destruiu a cooperação e abriu caminho ao assédio moral dos professores, que conduz ao desespero e ao isolamento».

          Santana Castilho entende que a avaliação dos professores só faz sentido se servir «para identificar obstáculos ao exercício correcto da actividade docente, para os remover, e não escravizar pessoas». Caso contrário, os «professores deixam de ser professores» e «crescem, assim, o número de escolas que se transformam em pequenas ilhas de tirania», à semelhança da experiência clássica de «ratos fechados numa gaiola que se tornam agressivos».

          «Se não invertermos esta lógica, não nos devemos espantar se ao Luís e ao José António se sucederem outros», remata.

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          Verão 2009, 
          em A Página da Educação, N.º 185, série II, Página 6
          Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa
          retirado daqui :


          Santana Castilho acusa responsáveis do ministério da Educação de serem “tecnocratas” e “manipuladores de estatísticas”
          --------------------------------------------------------------------

          QUEM CONCEBEU ESTE MODELO (DE AVALIAÇÃO) SÓ PODE SER IGNORANTE

          (...)
          No seu habitual registo cáustico, Santana Castilho denuncia nesta entrevista as incongruências e as debilidades que, na sua opinião, marcam o sistema educativo português, critica a ministra da Educação por não ter um projecto para a escola portuguesa e acusa a actual equipa de Maria de Lurdes Rodrigues de não ter “competência técnica nem humana” para assumir a tutela.
          .

          Inicio esta entrevista colocando-lhe uma questão muito directa: até que ponto a política educativa do actual Governo se adequa às necessidades educativas do país?
          Na minha opinião não se adequa de todo às necessidades educativas do país. Este Governo não tem nos seus decisores políticos pessoas com conhecimento de causa. Em primeiro lugar, do que é uma criança, do que é um jovem, do que é um estudante universitário, e do que significa educá-los. O problema educativo começa por aí, por perceber o que é uma pessoa e quais são as suas necessidades educativas. Depois, não têm também a noção de quais são as necessidades do país e de que forma a escola deve entroncar nelas.
          Não sabendo praticamente nada do ponto de vista humano e não tendo um projecto para o país, obviamente que será difícil encontrar um lugar-comum entre as necessidades da pessoa e as necessidades do país. E isso resulta num desastre educativo. A educação neste país está num autêntico buraco negro. Devo dizer que em 35 anos de democracia nunca vi uma situação tão calamitosa como a actual.
          .
          Será ir longe demais afirmar que a actual equipa ministerial não tem competência para a tutela?
          Não tem competência técnica nem competência humana. São tecnocratas que encaram a vida e as pessoas como coisas, vendidos a uma lógica de organização social assente na linguagem mercantil e na manipulação de estatísticas.
          .
          Que em grande parte poderá explicar a revolta que levou os professores em massa às ruas...
          Não explica tudo. Os professores são uma classe heterogénea e naturalmente as motivações que os levaram à rua - primeiro 100 mil, depois 120 mil - serão as mais diversas. Mas eu diria que, fundamentalmente, o que motivou a mobilização em massa da classe foi o ataque mais inqualificável, a redução à expressão da total indignidade profissional, a atitude de desconsideração, a tentativa de vergar os professores não por questões que poderiam ser discutíveis do ponto de vista das doutrinas, mas por questões que se prendem com a dignidade profissional e até a dignidade humana.
          .
          Na sua crónica de hoje no jornal Público (15 de Abril) refere que “a maioria dos professores aceitou hoje o que ontem havia rejeitado”, acrescentando que aquilo que resta é “insuficiente para contrapor ao fanatismo dos que mandam e querem reduzir o trabalho dos professores aos automatismos dos resultados”...
          Sim, de facto houve um capital de luta e de união entre os professores que se está a perder. Penso que isso é incontestável. No meio de tudo isto, a avaliação do desempenho não passa de um fait-divers, uma questão menor, tal como refiro nesse artigo. A avaliação do desempenho não tem o valor que lhe dá quer o Ministério da Educação, quer as empresas, quer a própria sociedade. Toda a gente se refere a ela como se fosse algo sagrado, incontestável. E não o é. A avaliação do desempenho é uma forma de intervir nas relações de trabalho, com as suas vantagens e inconvenientes. E quando ela é estereotipada, como é o caso deste modelo, traz muitas desvantagens.
          As organizações sérias, maduras, estão hoje muito mais apostadas naquilo que se denomina “cultura organizacional” do que propriamente na avaliação do desempenho. E poderiam dar-se imensos exemplos dos seus efeitos perversos, de que este modelo de avaliação dos professores está repleto. De que forma se pode medir o desempenho de um professor? É um lugar-comum dizer isto, mas de que forma se pode avaliar um professor cujos alunos são oriundos de extractos sociais económica e socialmente desfavorecidos quando comparado com outro que tem alunos favorecidos? Depois, de que forma se vai repercutir no seu desempenho as não aquisições anteriores dos alunos? Como é que se pode ser responsabilizado quando se está perante um aluno com um percurso escolar extremamente debilitado? Como é que se pode ser responsabilizado por um aluno que não quer trabalhar, que não quer estar na escola? E depois manipulam-se todos estes argumentos, com discursos demagógicos.
          .
          O discurso oficial defende uma maior autonomia para as escolas e para os professores. A impressão generalizada, porém, é que essa autonomia é crescentemente cerceada. Qual é a sua opinião?
          Na minha opinião há um reforço da centralização - de facto -, com um discurso de autonomia em pano de fundo. Este Governo, aliás, tem tido uma postura absolutamente centralista, anunciando uma medida para fazer depois o oposto. Veja-se o caso do agrupamento de escolas de Santo Onofre, onde um conselho executivo legalmente eleito e em funções, que por três vezes fez o que era esperado para encontrar alguém interessado no novo processo de gestão, foi simplesmente afastado. A lei, no entanto, refere claramente que os conselhos executivos se devem manter em funções até ao final do mandato. O Governo limitou-se, neste caso, a descarregar a sua ira no órgão de gestão - que até é publicamente reconhecido pela sua competência e que dirige uma escola à qual foram outorgadas distinções e prémios pelo próprio poder político. O que é isto senão espezinhar a autonomia?
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          Que comentário faz relativamente a este novo modelo de gestão das escolas?
          Mais uma vez, penso que é um modelo claramente centralista e que, do meu ponto de vista, irá partidarizar as escolas e colocá-las sob a tutela do Governo. O modelo de gestão democrática das escolas tinha muitas lacunas, mas este é pior na medida em que concentra o poder numa só pessoa. Uma das características basilares da democracia é a possibilidade de o poder se distribuir por diferentes órgãos, que se equilibram e vigiam mutuamente. Todas as soluções que concentrem o poder numa só instituição, quanto mais numa só pessoa, são más para a democracia.
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          As escolas não são empresas
          De que forma viu o processo de avaliação de desempenho dos professores e a forma como ele foi negociado com os sindicatos?
          Se há um aspecto comum a toda a produção legislativa do Governo é o facto de ela não ter sido discutida de facto com os sindicatos - eu não sou sindicalizado, nunca fui, tenho sido por vezes crítico acerca da postura dos sindicatos, por isso estou à vontade para afirmar que se há algo que não concebo é uma democracia sem sindicatos. Fazer discursos contra o movimento sindical e eleger os sindicatos como inimigos políticos é, na minha perspectiva, incompatível com o pensamento democrático. Sobretudo tendo em conta que é inquestionável o papel extremamente relevante que os sindicatos tiveram na história contemporânea da educação relativamente à profissão docente.
          Para este Governo o debate é uma figura de retórica. Não vale a pena recordar aqui episódios em que diplomas legais têm sido entregues aos sindicatos para discussão no próprio momento da reunião, de discussões públicas cujas propostas são pura e simplesmente ignoradas pelo governo. Uma autêntica farsa, portanto. Seria preferível que o Governo assumisse de facto a sua tendência ditatorial e decretasse a ditadura educacional durante a legislatura. Pelo menos seria mais sério e não passaria um atestado de menoridade aos professores.
          .
          Fará sentido separar dois processos tão estreitamente relacionados como a avaliação das escolas e a avaliação dos professores?
          Não, julgo que não faz sentido. E toda a gente – desde a classe política, aos sindicatos, passando pelos professores e pela opinião pública - fala de avaliação quando de facto discute “classificação de desempenho”, que são duas coisas completamente distintas. Eu diria que 80 por cento do debate se centra no processo de classificação, que é, digamos assim, a sua fase menos nobre. Em gestão interessa-me avaliar. E avaliar é comparar um percurso percorrido com aquele que se delineou, e verificar porque razão eles eventualmente não coincidiram. E quando não coincidem, identificar os motivos, modificando o planeamento ou dando condições àqueles que estão encarregues do processo de o fazerem devidamente.
          .
          Concorda, por isso, com a ideia de que avaliar não implica necessariamente classificar...
          Claramente. O importante na estratégia de uma organização é garantir que os seus recursos humanos e materiais consigam atingir os seus objectivos no menor espaço de tempo e com o menor dispêndio possível. E garantindo algo de fundamental, mas que frequentemente fica esquecido: o contentamento de todos os implicados. A isso chama-se avaliação e pode ser feito sem nunca classificar as pessoas. Não quero com isto dizer que sou contra a classificação, mas é preciso que se perceba que uma coisa é avaliar, outra é classificar. Por outro lado, é preciso ter consciência de que há determinado tipo de desempenhos que podem ser difíceis de classificar. E o desempenho de um professor adequa-se sem dúvida a esta categoria.
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          A ideia que passou para a opinião pública foi de que os professores não queriam ser avaliados...
          A política seguida por este Governo foi de pôr o português comum contra os professores, nomeadamente com o discurso dos privilégios, que ganham muito, etc. Mas os professores têm a perfeita consciência de que não é fácil reduzir o seu desempenho a um número, a uma expressão. E a metodologia seguida por este modelo é absolutamente caótica do ponto de vista técnico. Quem concebeu este modelo só pode ser ignorante – e estou a medir bem o que afirmo.
          Fala-se muito de empresas públicas e de empresas privadas, de empresas e de escolas. Ora uma escola não é uma empresa nem pode ser encarada como tal. Mas mesmo uma empresa com um funcionamento eficaz (e sei do que estou a falar porque tenho trabalhado em avaliação no contexto empresarial) jamais adoptaria este modelo, porque se o fizesse corria o risco de aviltar e desmotivar os seus recursos humanos.
          .
          Já se referiu à necessidade de a educação e a escola estarem imbuídas de um carácter humano. As actividades complementares postas em prática nas escolas são muitas vezes criticadas pelo facto de terem um carácter concentracionário, uniformizador e escolarizado. Concorda com esta crítica ou tal proposta pode ser encarada como realmente válida?
          Não, na medida em que é uma proposta de gente que não sabe que a escola, antes de mais, deve saber cuidar da pessoa na perspectiva humana. E hoje em dia as crianças do ensino básico passam mais tempo numa escola do que os operários numa fábrica. Devíamo-nos interrogar seriamente sobre a sociedade que estamos a criar, onde se pede aos pais que entreguem os filhos ao Estado quase 40 horas por semana. E agora querem manter as escolas abertas 12 horas por dia... Essa gente tem filhos? Sabe qual é a necessidade de uma criança? Tem alguma noção do que é uma sociedade organizada em termos humanos? Isto não é discurso balofo. É que as pessoas são pessoas. E se um pai gera um filho certamente será para o educar, não para abdicar da educação dele em benefício do Estado.
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          As escolas formam mal os professores? Cria-se um exame de admissão. Isto é de loucos...»
          Tendo em conta a sua experiência como docente na Escola Superior de Educação de Santarém e o seu contacto próximo com a formação inicial de professores, que apreciação faz da formação que é ministrada nesta área em Portugal?
          O que lhe vou dizer parte da minha experiência como profissional. Não o posso fundamentar em estudos sistemáticos, porque eles não existem. Esse, aliás, é um dos problemas da educação em Portugal: não existirem registos que permitam comparar desempenhos ao longo dos tempos. Em nenhum nível de ensino. Quando se argumenta que hoje em dia se aprende mais ou menos, que a formação é melhor ou pior, tudo parte das respectivas experiências empíricas.
          Respondendo à sua pergunta, considero que a formação que actualmente se ministra aos futuros professores é débil e tem vindo a decrescer de qualidade. Os formandos concluem os seus cursos com uma preparação científica débil e com uma preparação pedagógica e didáctica palavrosa, mas ineficaz. Em resumo: não saem formadas convenientemente. A formação de professores é, sem dúvida, um dos aspectos cruciais da educação que carecia de intervenção, porque cada vez é menos exigente. Essa é uma marca que, de resto, atravessa todo o sistema educativo. A escola exige cada vez menos aos alunos.
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          E no que se refere à entrada na profissão? Há quem defenda que uma certificação e um estágio integrado são suficientes. O Ministério da Educação diz que não. O que pensa acerca disto?
          Penso que este é mais um exemplo de como a classe política resolve as questões: os tribunais funcionam mal? Cria-se uma alta autoridade contra a corrupção. Os institutos de engenharia ou as faculdades de direito preparam mal? A respectiva ordem cria um exame e diz “estes valem, os outros não”. As escolas formam mal os professores? Cria-se um exame de admissão. Isto é de loucos...
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          Especificamente no que se refere à classe docente...
          O problema não se resolve com um exame de admissão à carreira, porque isso é passar um atestado de menoridade às escolas. Faz sentido o Governo autorizar uma escola a outorgar diplomas aos cidadãos que a procuram, cobrar-lhe propinas e o mesmo Governo vir dizer que essa formação não é válida sem passar por um exame, ainda por cima com uma nota mínima? Isso não é forma de tratar os problemas, é uma perspectiva burocrática da questão. Aquilo que é preciso fazer é pôr quem passa os diploma a fazê-lo com competência. Ou então retira-se o alvará de ensino. Se a escola não presta, fecha-se a escola.
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          É preciso questionar para que serve a escola pública
          Um dos maiores problemas do ensino em Portugal é o insucesso escolar, que marca uma percentagem significativa dos alunos que frequentam não só o ensino obrigatório, mas também o ensino secundário. Será o ensino de segunda oportunidade, nomeadamente os Centros de Reconhecimento e Validação de Competências, uma forma de resolver a questão? Será que a escola não deveria intervir a tempo de prevenir este insucesso, mais do que depois fazer esta oferta pós-insucesso?
          Não sou contra a possibilidade de conceder uma segunda, terceira ou quarta oportunidade às pessoas. O que eu não posso é aceitar que o sistema não seja exigente na primeira para depois justificar o aparecimento das seguintes, quando ainda por cima são tanto ou mais permissivas do que a primeira – refiro-me concretamente ao Programa Novas Oportunidades. Claro que existem casos em que o processo funciona honestamente, mas genericamente é uma farsa.
          Uma coisa é reconhecer socialmente o conhecimento que um determinado profissional adquiriu de uma determinada profissão, que não é abordado na escola. Isso é algo de útil e justo. Outra coisa bem diferente é atribuir um diploma do 9º ano de escolaridade obtido em seis meses ou nove meses. E o problema não é o tempo em que é obtido. É que ao fim desses seis ou nove meses o candidato não sabe nada daquilo que alguém com o 9º ano é suposto saber. Isto é uma farsa total, absoluta. O que se está a fazer é aldrabar o país, a começar pelos próprios candidatos, que obtêm diplomas que não valem coisa alguma. Estamos a hipotecar o país, a desacreditar completamente tudo aquilo que certifica o conhecimento das pessoas.
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          Coloquei a minha questão sobretudo no sentido de saber a sua opinião sobre a forma como a escola deveria adequar a sua oferta no sentido de prevenir o insucesso, nomeadamente repensando o currículo unificado tal como está proposto no ensino básico - e que talvez contribua para esse insucesso. Não considera, por exemplo, que um currículo flexível, embora igualmente exigente, pudesse dar uma resposta mais eficaz?
          A questão do currículo é complexa. Um dos grandes problemas do nosso sistema de ensino é a total ineficácia e descoordenação dos planos de estudo. Se repararmos bem, hoje em dia a escola é um refugo de tudo aquilo que a sociedade não consegue resolver. E isto não pode ser. Tem de se definir qual é a missão da escola, as suas prioridades e ter a noção de que ela não pode fazer tudo. E sobretudo tem de se perceber que as crianças e os jovens têm necessidades básicas absolutas correspondentes às suas faixas etárias, às quais é necessário responder com qualidade, exigência e eficácia. Para isso, é indispensável não só ter planos de estudo articulados, mas também definir o que é prioritário e o que cabe nesse espaço curricular para corresponder a essa qualidade. E esta qualidade define-se.
          As pessoas passam a vida a falar da escola de qualidade. Mas o que é uma escola de qualidade? O que é um programa de qualidade? O que querem os pais para os seus filhos? O que vou dizer será provavelmente uma utopia, mas penso que se calhar temos de começar por organizar a sociedade para que os pais, quando geram um filho, saibam exactamente porque razão o fazem e tenham noção das suas responsabilidades.
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          Falta, então, um projecto para a escola portuguesa...
          Sim, claramente. Qualquer organização tem objectivos. Se perguntarmos à escola qual é o objectivo da escola obteremos inúmeras respostas. Cada qual terá a sua opinião, mas a maior parte não sabe dizer coisa nenhuma. Pergunte à ministra da Educação qual é o objectivo da escola e eu garanto-lhe que ela não saberá responder - ou a resposta que der é disparatada. Basta ver a forma como ela está organizada actualmente e penso que estamos conversados sobre o assunto.
          É preciso questionar para que serve afinal a escola pública, o que se deve ensinar a uma criança no ensino básico. Veja-se os programas, são risíveis, ninguém entende o que aquilo quer dizer... A expressão “eduquês” resultou de facto bem, e está patente em tudo aquilo que os “pedabobos” escrevem para a educação. Mas a verdade é que são seguidos acefalamente pela maioria das pessoas.
          Fico também muito surpreendido com os professores ao reparar que eles gostam que se lhes chame educadores. Porque os professores não são educadores, são profissionais de cuja actividade deriva um contributo para um processo de educação dos cidadãos. Afinal, cada um é responsável pelo seu projecto educativo.
          Nós precisávamos de parar para debater estas e outras questões, porque não há suficiente debate social sobre a educação. E ele verdadeiramente falta ao país. Mas infelizmente parece que não temos tempos para discuti-las. Vivemos numa sociedade completamente invertida, completamente tonta. Esta crise económica que estamos a viver, por exemplo, mostra bem a ganância das pessoas, a discrepância entre aqueles que ganham salários de cento e tal mil euros e ainda têm o desplante de vir dizer que os salários mínimos deviam ficar congelados para salvar o país. Estas afirmações ultrapassam a minha capacidade lógica. E a escola tem obviamente muita responsabilidade neste quadro.

          Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa


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          entrevista ao Jornal de Leiria 
          - ano ?

          Santana Castilho defende que a ministra da Educação se devia demitir, pelo seu péssimo desempenho, e entende que se os professores tivessem tomado medidas mais duras esta guerra já tinha terminado. Lamenta que a falta de exigência e rigor atravesse todo o sistema de ensino e diz que o programa Novas Oportunidades é uma “aldrabice”. Descontente com os sucessivos governos, equaciona votar em branco nas próximas legislativas. 

          O secretário de Estado Jorge Pedreira ameaçou com processos disciplinares os professores que se recusem a ser avaliados e os avaliadores que travem o processo. Que conselho dá aos destinatários desta mensagem?
          Que sejam coerentes com aquilo que fizeram anteriormente e que pensem que o problema que está em jogo, muito mais do que um problema simples de avaliação de desempenho, é um problema de dignidade do exercício da profissão docente. Os professores devem fazer aquilo que entendem que melhor serve o exercício da docência. O problema que se põe não é os professores quererem ou não quererem ser avaliados. É a qualidade daquele instrumento de avaliação e daquilo que ele significa. Em relação aos aspectos práticos do campo jurídico, as pessoas devem ler calmamente a legislação. Há opiniões muito diversas. A ameaça de processos disciplinares é mais um expediente nesta guerra de alecrim e manjerona.

          Que consequências podem decorrer deste clima de intimidação?
          Toda a instabilidade em que as escolas estão mergulhadas. É um prejuízo enorme para os alunos. Aquilo que um professor deve fazer é ensinar. É uma palavra que os responsáveis pelo ministério não gostam de usar. Fizeram o Estatuto da Carreira Docente e não usaram a palavra ensinar uma única vez. Hoje não se valoriza o conhecimento e o saber pelo conhecimento. Dá-se uma prevalência total aos resultados. A todo o custo. Tem valido tudo, desde que as estatísticas melhorem e o número de diplomados aumente. Para quem tem consciência social é muito difícil de aguentar.

          A que se refere?
          A toda a estratégia deste Governo para pintar de cor-de-rosa aquilo que é negro e que não se modifica com diplomas a pataco. Modifica-se com políticas sérias, que demoram tempo. Em relação ao ensino profissional, de que é que se trata? De ter escolas apetrechadas com oficinas e laboratórios para formarem pessoas em áreas tecnológicas? Não. O que temos são soluções curriculares para manter na escola, a qualquer preço, toda a gente que a abandonava. Faz-se tudo. Até já se dão equivalências ao 9º ano com cursos de Futebol e ao 9º e 12º anos com seis meses de actividade. Não são Novas Oportunidades. São novíssimas aldrabices.

          Estas medidas irão reflectir-se na qualidade dos alunos?
          Isso é inquestionável. Há todo um conjunto de objectivos deste Governo que são superficiais e um prolongamento da incultura de quem nos governa. O dr. Medina Carreira dizia que há factos que são esclarecedores do que está por trás das pessoas. Depois de ter dito que o primeiro-ministro é um excelente propagandista, lembrou que quando esteve no governo os ministros da altura resolveram presentear o primeiro-ministro Mário Soares com um quadro. Os ministros deste Governo ofereceram um fatito a José Sócrates. Os tempos, de facto, são diferentes.

          Faz sentido envolver alunos e funcionários não docentes nesta luta pela qualidade do ensino público?
          Faz sentido envolver todos os portugueses que tenham consciência do que está em jogo. Este é um problema nacional. Não tem havido debate social na sociedade sobre os problemas da Educação. Este modelo de desempenho dos professores, além de ser tecnicamente mal feito, não está concebido para provocar efeitos na gestão do desempenho. O que visa é seriar as pessoas de acordo com critérios injustos e incorrectos para efeitos meramente económicos.

          Quais as medidas mais graves neste pacote de medidas reformistas?
          É tudo muito grave. Mas, voltando ao problema da avaliação, a divisão da carreira em duas. Havia uma espírito de equipa nas escolas que hoje está a sofrer clivagens terríveis. As pessoas entraram numa competição que não é salutar. O facilitismo é patente nas escolas. O Estatuto dos Alunos e o que se permite aos alunos é um quadro de laxismo total. É mais fácil produzir uma nota de 500 falsa do que exercer qualquer actividade disciplinar sobre um aluno. As pessoas não têm noção de como é difícil hoje manter a autoridade do professor. Pede-se tudo à escola. A sociedade quando não sabe resolver os problemas descarrega na escola.

          Dia 19 está agendada a terceira greve nacional contra as políticas educativas do Governo. A persistência dos professores acabará por levar o Governo a ceder?
          Nunca se devia ter chegado a este ponto. Governar em democracia não significa convencermo-nos que detemos a verdade e impor o nosso ponto de vista a uma comunidade inteira. E ainda por cima com a formação mais avançada deste País. Este conflito já devia ter terminado há muito tempo. A solução seria a saída desta equipa, mas não me parece que o primeiro-ministro demita seja quem for. Mas a ministra da Educação pode apresentar a sua demissão. Este Governo não tem particular apetência para reconhecer erros, o que só o dignificaria. Reconhecer os erros e dizê-lo publicamente é manifestação de espírito superior. E o espírito deste Governo é manifestamente inferior.

          Como avalia o desempenho de Maria de Lurdes Rodrigues?
          Como professor dar-lhe-ia zero. Como cidadão, dois abaixo de zero. Do ponto de vista técnico, a ministra demonstrou que não tem a mínima noção do que é gerir o sistema educativo e, do ponto de vista humano, merece um desprezo profundíssimo. É uma pessoa impreparada para desempenhar o cargo de responsabilidade que é ser ministra da Educação.


          “A lei é para obedecer, mas também é para ser contestada”


          Quando participou num plenário em Leiria afirmou que ao longo da sua vida profissional foi alvo de 17 processos disciplinares, por nunca se ter vergado.
          O poder tem sempre tendência para impor os seus pontos de vista. Aquilo que a lei estabelece, muitas vezes, não é legítimo e não é o mais justo. Há pessoas com diferentes tipos de consciência cívica e social. Há muita gente que não tem outro remédio se não conformar--se com as situações das quais discorda e há pessoas que têm o privilégio, que é o meu caso, de sempre que entenderam que o que lhe impunham era injusto e incorrecto diziam “eu não o faço” e faziam de uma maneira diferente. Tenho um passado de desempenho de funções de Direcção em escolas muito grande, em que tive gravíssimos problemas com o poder político. Há uma atitude da sociedade, que é muito cultivada, de que a lei é para obedecer cegamente. A lei é para obedecer, mas também é para ser contestada, quando é iníqua. E nós temos muitas leis iníquas. E depois temos os próprios políticos, que desrespeitam as leis que eles próprios fazem.

          Os professores deviam tomar medidas mais radicais para pressionar o Governo a recuar?
          Uma das características da nossa sociedade e das nossas lutas, muitas vezes, é ser demasiado serena quando as coisas que estão em jogo são demasiado importantes. Sim. Os professores deveriam já ter tomado medidas que provavelmente teriam resolvido este conflito há muito mais tempo. Os professores podiam dizer ao Ministério da Educação: “sou funcionário público e quero estar 35 horas na escola para ver os meus testes e fazer tudo o que tenho a fazer”. Isto implodia o sistema, porque as escolas não estão preparadas para ter lá os professores.


          “Bolonha é um logro”


          A generalidade dos alunos chegam bem preparados ao ensino superior?
          Não. Pessimamente. E também não é melhor preparado no ensino superior. A falta de exigência e de rigor atravessa todo o sistema. É fruto de muito facilitismo. No ensino superior, começou com o alargamento sem critério na década de 80. Com a abertura ao ensino privado, a exigência caiu. E agora com esta lógica de Bolonha não fizemos melhor. Acabámos por piorar ainda mais o sistema. Não é possível meter em três anos aquilo que antes se fazia em cinco. As pessoas têm mais certificação, mais diplomas, mas têm menos qualificação. Bolonha é um logro. É dizer à sociedade que as pessoas têm conhecimentos e competências que, em bom rigor, não têm. Estamos muito orientados para esta doutorice.

          O que pensa sobre a criação de consórcios de instituições do ensino superior?
          É uma moda. É evidente que a rede cresceu desordenadamente e que alguma coisa é preciso fazer para a redimensionar e para a racionalizar. A filosofia que preside aos consórcios é do tipo daquela que leva os ministros a oferecer um fatito ao primeiro-ministro. É não tentar resolver os problemas com coerência, conhecimento e participação. É a chegada de alguém iluminado que diz: “agora passa a ser assim”. E depois, acefalamente, os indígenas vão atrás e fazem.

          Redimensionar a rede pode passar pelo encerramento de algumas instituições de ensino?
          Sim. Encerrar umas e, se calhar, abrir outras. Cursos e instituições. As instituições mais pela falta de qualidade evidente que têm. Algumas. A procura não é um indicador favorável porque os portugueses, infelizmente, muitas vezes procuram as instituições que mais rapidamente os diplomam e com menos exigência. Vimos isso nalgum ensino privado. Também não seria pelo critério dos doutores, porque há muitos incompetentes. Iria pelo critério da qualidade das instituições, depois de definido o que é qualidade.

          Parece bastante descontente com o Governo. Qual será o seu sentido de voto nas legislativas?
          Tenho estado bastante descontente com muitos governos. Estou profundamente descontente com este regime político. Sei em quem não votar e sei que não votarei PS. Mas o problema que se põe aos portugueses é a alternativa. Não a vejo. Mas estou a lembrar-me daquela velha proposta de José Saramago, que tem um significado político grande, se todo ordenamento político não tratasse como trata o voto em branco. Poderia ser um aviso muito claro para os políticos de rejeição deste regime, que não resolve os problemas as pessoas, que não tem nada de democrático.

          “A autoridade dos professores diminuiu terrivelmente”


          “É evidente que a autoridade dos professores diminuiu terrivelmente. E com as políticas deste Governo é cada vez é menor. Isso tem reflexos nos actos de indisciplina e de desrespeito para com o professor, que aumentaram terrivelmente. Hoje, castigar um aluno é uma coisa demoníaca”, afirma Santana Castilho. Professor coordenador da Escola Superior de Educação (ESE) de Santarém, foi com alguma renitência que partilhou as suas habilitações académicas, por não querer dar uma “ideia de doutorice”. Licenciado em Educação Física, frequentou estudos de pós-graduação em Avaliação Educacional e em Avaliação e Ensino para Deficientes e é doutorado em Gestão. Nas breves notas biográficas que entregou ao JORNAL DE LEIRIA refere que é cronista do Público, foi membro do Governo de Pinto Balsemão “sem filiação partidária”, presidente da ESE de Santarém e do Instituto Superior Politécnico de Setúbal. Foi ainda consultor do Banco Mundial, da União Europeia e da UNESCO em projectos educacionais de âmbito internacional. Docente há 38 anos, lamenta que a escola não esteja “orientada para formar o pensamento livre e a crítica” e que os professores treinem mais os alunos a “obedecer e a repetir do que a questionar e a criar”.

          Perguntas dos outros

          Luísa Falcão, dirigente sindical
          Neste momento conturbado, em que os professores portugueses estão a ser responsabilizados por quase tudo o que está mal no sistema educativo, quais deveriam ser os critérios a exigir para o exercício da profissão docente?
          Por Educação entendo tudo, e sublinho tudo, aquilo que se acrescenta à simples natureza humana: o que programámos e o que não foi programado; o "bom" e o "mau"; o que queríamos e o que, sem querer, as circunstâncias nos apresentam. Ensinar é impressionar com uma marca, passe o pleonasmo. O ensino é, portanto, sempre intencional e programado. Aquilo que se espera de um professor é que ensine o que a sociedade decidiu que deve ser ensinado. Assim sendo, tem que ser sólido no conhecimento científico do que ensina, no conhecimento da natureza integral do aluno, e aqui temos as correlatas áreas, de que a Psicologia é exemplo, e dominar, ainda, o que lhe permite articular as variáveis anteriores. Refiro-me à mestria na comunicação e nas metodologias. São estas, do meu ponto de vista, as três vertentes sem as quais não há professor.

          Luciano de Almeida, presidente do Instituto Politécnico de Leiria
          Foi recentemente nomeado o Conselho de Administração da Agência Nacional de Acreditação e Avaliação. Quais as suas expectativas relativas ao seu funcionamento e às consequências da avaliação?
          As expectativas são curtas por duas razões. Primeiro, em Portugal, quando algo que já existe não funciona ou funciona menos bem, em vez de corrigirmos o que há a corrigir para que o que existe faça o que deve, puxamos pela cabeça, quase sempre de um iluminado, e criamos um novo órgão, de preferência com nome comprido e sigla que fique no ouvido. Dá--se uma de modernidade e até se arrumam amigos ou incómodos. Segundo, não vou na onda da moda que descobriu que só é válida a avaliação que seja externa. As universidades e os politécnicos têm competência instalada para fazerem melhor que qualquer agência pseudo independente. Assim possam pôr a avaliação ao serviço da gestão do desempenho. O aporte externo é, tão-só, um aporte, que não o mais relevante, de um processo cuja complexidade fica melhor servida com outro tipo de abordagens. Até parece que desconhecemos ao que nos conduziram tantas avaliações feitas por tantos conceituadíssimos avaliadores externos!

          Alexandra Barata



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          Julho de 2006
          em a Página da Educação

          Avaliar e classificar: o papel dos exames
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          À medida que um ano lectivo vai decorrendo, torna-se crucial saber em que ponto do percurso se encontram os alunos. Só assim se pode verificar se os progressos realizados permitem, ou não, chegar, no final do ano, às metas desejadas. Sem esta informação não é possível adoptar as estratégias necessárias à solução das dificuldades que vão surgindo. A avaliação é, assim, fundamentalmente, descritiva e informativa. Descreve o que é, ou seja, a situação do aluno num dado momento e compara-a com o que deveria ser, isto é, com a situação que se desejaria face aos objectivos enunciados, identificando as discrepâncias existentes.
          Dos três tipos habituais de avaliação, diagnóstica, formativa e sumativa, é a formativa a que verdadeiramente acompanha e interfere no processo de ensino e a que contribui para um melhor cumprimento dos objectivos de ensino. Neste sentido se diz que a avaliação formativa é a que, fundamentalmente, serve alunos e professores.
          Classificar significa colocar um indivíduo ao longo de uma escala adoptada, de acordo com o resultado que obteve numa ou mais provas a que foi submetido.
          A classificação resulta de uma comparação de resultados obtidos: ou os resultados são comparados entre si, sendo o lugar que o indivíduo ocupa na escala determinado pela sua posição relativamente aos restantes membros do grupo de que faz parte, ou os resultados são comparados com um padrão pré-estabelecido, sendo o lugar que o indivíduo ocupa determinado pela distância a que se encontra do máximo possível de conseguir. No contexto escolar português, a classificação enquadra-se na segunda modalidade enunciada.
          A colocação ao longo de uma escala não só distingue os que ficam acima da mediana dos que ficam abaixo, isto é, os que ?satisfazem? dos que ?não satisfazem?, como também relaciona os elementos entre si.
          Assim, a classificação valoriza e seria, enquanto a avaliação descreve e informa. A avaliação tem um carácter formativo, enquanto a classificação tem um carácter selectivo.
          Do exposto resulta que não pode haver classificação sem uma prévia avaliação de resultados obtidos. Um sistema de classificação não dispensa um sistema de avaliação, de que depende. A recíproca não é, no entanto, verdadeira: pode haver avaliação sem se seguir qualquer espécie de classificação.
          Aqui chegados, importa referir que um sistema de classificação tem limitações, a saber:
          - As classificações tornam-se, muitas vezes, para professores, alunos e pais, fins em si mesmos e não instrumentos ao serviço do ensino.
          - Despertam um sentido de competição entre os alunos, nem sempre saudável e correspondente ao desejo de saber mais.
          - Provocam, muitas vezes, efeitos laterais negativos, a saber: ansiedade e nervosismo, complexos de inferioridade e adopção de meios inapropriados para a solução das dificuldades (copiar e decorar, por exemplo).
          Mas um sistema de classificação tem, também, vantagens. Como elo de ligação e de certificação entre a escola e a restante sociedade é insubstituível. Como o são, por essa lógica, os exames.


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