29/03/2023

Todo o poder só se constrói sobre o consentimento dos que obedecem

 


no Público

29 de Março de 2023

por Santana Castilho*

 

1. Depois de meses de continuada contestação, os professores apenas reforçaram a sua coesão e ganharam apoio público. São resultados exíguos, que sugerem a pergunta: acabarão os professores por cumprir imposições injustas, que os derrotam?  

Se há coisa que se afigura clara para quem vem acompanhando a conduta do ministro da Educação nas negociações com os sindicatos é que as reduz a rituais fadados a epílogos coercivos, sob forma de decretos-lei, que não acolhem as pretensões mais importantes dos docentes. Assim sendo, parece evidente que só novas formas de luta poderão retirar os professores do impasse em que estão.

Ao longo dos anos foram crescendo diversas hierarquias de dominância (administrativas, pedagógicas, disciplinares, sindicais, políticas) no sistema de ensino, que desenvolveram nos professores uma tendência para simplesmente obedecer (mesmo discordando e reclamando) aos que detêm cargos de poder. Foram muitos anos de condescendência, ora por comodismo, ora por falta de opinião suficientemente formada sobre o que, em circunstâncias particulares, protege a desobediência. Com efeito, o problema maior da obediência é o de sabermos até que ponto é legítimo desobedecer.

Se olharmos para a história do pensamento humano, é forçoso reconhecer que muitos dos acontecimentos que promoveram o desenvolvimento e o progresso das sociedades radicaram em actos de desobediência. Por outro lado, sabemos que quanto maior é a coesão dentro de um grupo, mais fácil se torna resistir e desobedecer às pressões que o agridem. É este o momento ímpar, de uma fortíssima coesão entre os docentes, que ora se vive. Luís Costa, um dos professores mais abnegados da nossa classe, entendeu-o e convidou os colegas a assumirem publicamente o compromisso de desobedecerem à prestação de serviços mínimos ilegais. Fê-lo com um texto bem fundamentado em várias disposições legais e no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 10.10.18, que declarou ilegais os serviços mínimos anteriormente determinados para greves às avaliações finais. Oxalá muitos o sigam, para que as coisas mudem e a Educação ganhe.

2. As perplexidades subjacentes ao que acabo de escrever ficaram patentes no que acabou por ser a primeira reunião da nova ronda negocial, com uma ordem de trabalhos circunscrita aos seguintes temas: correção dos chamados “efeitos assimétricos” sobre a carreira docente, decorrentes do período de congelamento; redução da burocracia nas escolas; correção da desigualdade na redução da componente letiva relativa à monodocência; regularização de vínculos de Técnicos Superiores e Técnicos Especializados sem funções de formação; apresentação de calendário negocial. Se é evidente que esta agenda deixa de fora o que é mais importante para o futuro da escola pública, a análise dos detalhes das primeiras propostas do ministro expõe a inutilidade do que se seguirá. Retomo a pergunta de partida: acabarão os professores por cumprir imposições injustas, que os derrotam? 

3. Das diferentes áreas da governação, a imagem que perdura é a de que quem manda não sabe o que fazer.

Acentuaram-se as desigualdades e cresceu o número de famílias profundamente afectadas pela queda do rendimento real, provocado pelo aumento dos preços dos bens de primeira necessidade.

Sem que disso se fale, reformados e pensionistas da Caixa Geral de Aposentações sofrerão cortes em 2024.

Enquanto o ministro da Saúde justifica a falta de comida no Hospital de Santa Maria com o estranho argumento de que a alimentação não é uma prioridade nas urgências, António Costa dá, em Santarém, 43 milhões de euros a projeto para passarmos a comer insectos.

Depois de uma semana de inusitada guerra aberta em torrão luso, Marcelo e Costa, então na República Dominicana, vestidos de igual, com uma espécie de bibe branco, mudaram o registo do fala-fala dispensável para modo de reality show de afagos e elogios mútuos. Sofreu a credibilidade de ambos e a qualidade da vida pública que nos oferecem.

Não vão bem a democracia, a liberdade e a paz social. Que bem nos faria, se todos reflectissemos sobre o alcance do título deste escrito: todo o poder só se constrói sobre o consentimento dos que obedecem.

*Professor do ensino superior

15/03/2023

Os professores entre a consciência e a lei

Os professores entre a consciência e a lei

Santana Castilho*

1. Como se esperava, terminou sem acordo a reunião suplementar entre o Ministério da
Educação e os sindicatos. O que se segue? A promulgação de um diploma que colocará
milhares de professores, contra a sua vontade, a centenas de quilómetros de casa, dificultará
ainda mais os mecanismos de aproximação à residência e conferirá aos directores o poder de
afastar os professores incómodos, mesmo que sejam do quadro. Numa palavra, passará a
vigorar um normativo que só piora o que já estava em vigor.
E seguem-se novas reuniões negociais para debater a recuperação do tempo de serviço. Mas
sobre a matéria, João Costa já esclareceu que as próximas negociações não se ocuparão da
recuperação do tempo de serviço de todos os professores, mas sim das compensações
(“correcção dos efeitos assimétricos”, no dizer do ministro) a atribuir aos que tenham sido
mais prejudicados durante o congelamento das carreiras.
Aquilo que o ministro agora apoda de “efeitos assimétricos” é uma epígrafe maliciosa para
uma ideia racionalmente sem nexo e eticamente desprezível. Limpando-a dos floreados
palavrosos do ministro, o que ela significa é isto: João Costa vai entrar, mais uma vez de má-fé,
numa negociação viciada, porque já tem o resultado antecipadamente determinado, qual seja
distribuir umas migalhas a uns e discriminar os restantes. Como se não tivessem trabalhado
todos, João Costa propõe-se promover ultrapassagens indecorosas, com um confrangedor
desprezo pela justiça mínima.
2. Duas sondagens recentes e a observação simples dos factos expõem o fracasso da estratégia
de manipulação da opinião pública promovida pelo Governo e, particularmente, por João
Costa, no contencioso com os professores. Mas, no domínio dos resultados, João Costa levou a
dele avante: a sua política ruinosa avançou e um péssimo decreto-lei vai ser aprovado num
Conselho de Ministros inerte ante a destruição do sistema nacional de ensino e da escola
pública.
A união genuína dos professores e a abnegação com que se entregaram a manifestar
publicamente a sua repulsa pelas políticas nefastas de que são vítimas não demoveram um
ministro desumano e incompetente. Daí a pergunta que se impõe: que fazer agora?
Talvez reflectir sobre a forma como Peter Singer aborda, no seu livro “Ética Prática”, a relação
entre a consciência individual e a lei. A dado passo, o autor formula esta pergunta:
“Temos alguma obrigação moral de obedecer à lei, quando a lei protege e sanciona coisas que
achamos totalmente erradas?”.
E Peter Singer responde a si próprio pela escrita de Henry Thoreau, assim:
“Terá o cidadão de entregar a sua consciência ao legislador, nem que seja por um só momento
ou no grau mínimo? Para que terá então todo o homem uma consciência? Penso que devemos
ser em primeiro lugar homens e só depois súbditos. A única razão que tenho o direito de
assumir é a de fazer sempre aquilo que penso ser justo”.

Posto isto, que bela lição dariam os professores a João Costa se o deixassem a falar sozinho
com o diploma que vai levar a Conselho de Ministros e nem um só dos contratados
concorresse à pérfida vinculação dinâmica! A que outra artimanha recorreria o criativo
ministro, para não ser levado ao Tribunal de Justiça da União Europeia, por incumprimento da
correlata Directiva 1999/70/CE?
3. A realização das provas de aferição em suporte digital é um processo que começa a revelar-
se como de princípio era de prever: sem computadores suficientes, sem estruturas de base
(rede eléctrica e de Internet preparadas e adequadas nas escolas) e muitos alunos
insuficientemente familiarizados com as rotinas informáticas, não passa de uma iniciativa de
novos-ricos irresponsáveis. O irrealismo (Projecto de Desmaterialização das Provas de
Avaliação Externa) terminará, antecipo, atribuindo, como é habitual, a culpa do fracasso às
escolas e à falta de formação dos professores.
A esta vertente operacional acresce a mais importante, sobre a qual venho a escrever, de há
muito: sendo a utilização do digital desejável e incontornável, não deve ser impulsionada por
dogmas políticos, antes com a consideração dos avanços científicos no domínio das
neurociências, particularmente da psicologia cognitiva. E esses avanços permitem expor a
pobreza pedagógica e a limitação de exames assentes em escolhas múltiplas.


*Professor do ensino superior

01/03/2023

As mercês pouco sérias de João Costa


António Costa disse que quando o ministro da Educação fala é ele que está a falar. Ora quando o António afirma que a recuperação do tempo de serviço dos professores custa 1300 milhões ao ano e o João diz que essas contas estão agora a ser feitas, em qual Costa devemos acreditar? Por outro lado, quando, há dias, o Ministério das Finanças disse que a recuperação custava 331 milhões, fê-lo sem antes ter feito contas?
Quando, na última entrevista ao Jornal das 8 da TVI, António Costa disse não ter sido ele nem um governo dele que congelou a carreira dos professores, apenas jogou com as palavras. Com efeito, era ministro do Governo durante cuja vigência foi determinado o primeiro congelamento da carreira dos professores (Lei 43/2005, de 29/08). Formalmente foi a Assembleia da República. De facto, a AR apenas obedeceu aos ditames de um Governo de maioria absoluta do PS.
Uma negociação séria e um entendimento justo não é um jogo de manipulação da verdade e dos factos.
É sério apontar a “queda” do Conselho Local de Directores como uma cedência, quando se propõe, a seguir, a criação do Conselho de Quadros de Zona Pedagógica, constituído pelos mesmíssimos directores, agora apenas referidos a áreas geográficas diferentes?
É sério anunciar como progresso que os quadros de zona pedagógica passam de dez a 63, diminuindo-lhes a extensão, quando os parágrafos sete e oito do artigo 55º do anteprojecto do DL, que estabelece o novo regime de gestão e recrutamento do pessoal docente, acaba por manter tudo como antes?
É sério o ministro e o primeiro-ministro apregoarem que querem acabar com os professores de “casa às costas”, quando os professores dos quadros de agrupamento, até agora inamovíveis dos seus agrupamentos, passam a poder ser deslocados para qualquer local dentro da sua zona pedagógica, para completarem horas lectivas?
É sério exigir aos que venham a adquirir vínculo que concorram a todo o país no concurso seguinte?
É sério o ministro da Educação dizer que a graduação profissional persiste como indicador universal para colocar professores, quando o normativo que propõe continua a dar mandato aos directores para a ignorarem?
Na peugada da miserável visão estratégica de Maria de Lurdes Rodrigues, de dividir para vencer, foi mais uma vez desastrosa a ideia, do ministro da Educação, de recuperar o tempo de serviço apenas para os professores colocados nos primeiros escalões da carreira. Sempre que João Costa fala, a chama da discórdia aumenta.
É minha convicção que a maioria dos professores actua diarimente ao contrário daquilo em que acredita. Sociologicamente, este comportamento paradoxal explica-se porque os professores foram simplesmente instruídos a fazer de determinado modo e estão condicionados pela propaganda e pelo medo. Sucede, neste quadro, que a sua obediência à autoridade tem limites.
Duas sondagens acabam de mostrar que os portugueses apoiam esmagadoramente a luta dos professores, enquanto o PS cai 9% nas intenções de voto. As continuadas mentiras e iniciativas pouco sérias do Governo para desacreditar a luta dos professores junto da opinião pública falharam.
Todavia, o Governo continua a fugir a uma negociação séria, pelo que é necessário, agora, produzir documentos com propostas de resolução do contencioso, que demonstrem, a par da firmeza, maturidade e sensatez. Do mesmo passo, devem os professores ser protagonistas de iniciativas arrojadas e inéditas, que respondam às tentativas governamentais de anular o direito à greve.
Dou um exemplo: aos serviços mínimos pode responder-se com serviços máximos. Que quero dizer com isto? Recusa absoluta de fazer em casa seja o que for. Permanência integral de 35 horas por semana nas escolas, sendo apenas e só no local de trabalho que os professores passam a cumprir as tarefas a que por lei estão obrigados. Notificação aos directores para que indiquem aos professores os espaços onde passam a preparar lições, corrigir testes e satisfazer todos os compromissos. Fim de utilização dos computadores pessoais e de Internet privada para aceder às plataformas do sistema. Fim de utilização de carro próprio para deslocação entre as escolas do agrupamento. Tudo legal, sem qualquer ónus possível para os professores.
A novilíngua, a do século da paixão de João Costa, o XXI, chama a isto "quiet quitting". 
 
In "Público" de 1.3.23

 

15/02/2023

Se não agora, quando?

 

 no Público

15 de Fevereiro de 2023

por Santana Castilho*

Em protesto contra um vasto número de questões que se foram acumulando, sem resposta, ao longo de sucessivos governos e anos, há mais de dois meses que estão activas greves no sector da Educação. Neste período, ocorreram quatro grandes manifestações em Lisboa e muitas mais por todo o país. Analisando o fenómeno, não importa sob que ângulo, é forçoso reconhecer que ele só é explicável por haver uma genuína, verdadeiramente espontânea rejeição dos professores relativamente às políticas que lhes têm sido impostas.

Se descermos ao detalhe, as causas mais próximas são, entre outras, uma crescente falta de professores, de professores de educação especial e psicólogos, de pessoal não docente, queixas relativas ao facilitismo e à indisciplina galopantes, ao aumento exponencial da inútil sucata burocrática, à precariedade, às regras abusivas que dificultam a progressão na carreira, ao desadequado e iníquo modelo de avaliação do desempenho, à extorsão de tempo de serviço, a salários baixos, ao tratamento desumano dispensado aos professores velhos e doentes e ao menosprezo pelos alunos mais vulneráveis, em nome de uma “inclusão” que exclui.

Se virmos de cima, é afinal a escola mínima, amputada de conhecimento e orientada para formar cidadãos disponíveis para aceitar trabalho apenas remunerado com salário mínimo, que os professores contestam. É este ensino público para os pobres, enquanto os ricos fogem para os melhores colégios privados, que os professores rejeitam.

Com efeito, passaram-se sete anos sob influência de uma ideologia pedagógica que reduziu os professores a meros receptores de directivas para produzir sucesso martelado e certificar a ignorância. Sete anos de uma propaganda que fala da geração mais preparada de sempre, quando apenas se trata, coisa bem diferente, da geração que mais tempo permaneceu, obrigatoriamente, na escola. Ora se houvesse dúvidas sobre a determinação dos professores em romper com o estado a que chegou o sistema de ensino, elas foram varridas pela gigantesca manifestação de sábado passado.

Aqui chegados, subsiste a dúvida maior: estará, finalmente, o Governo consciente de que tem de negociar ou, outrossim, continuará com a esperança, como maliciosamente o Presidente da República sugeriu, em que "há um momento em que a simpatia, que de facto há na opinião pública em relação à causa dos professores, pode virar-se contra eles"?

Se prevalecer a primeira hipótese, que me parece imperiosa e a única admissível, o Governo tem de negociar com seriedade, remover o seu descolamento da realidade, até aqui patenteado, corrigir a inércia para responder à crise e aceitar que o problema da recuperação do tempo de serviço não pode ser iludido. Tem custos? Naturalmente que sim. Mas os sindicatos já se manifestaram receptíveis a dilui-los ao longo de vários anos e a soluções parciais, para quem por elas opte, de traduzir parte deles em tempo válido para efeito de reforma. Tudo por forma a não prejudicar o equilíbrio das contas públicas. Por outro lado, importa recordar que, já em 2019, a Unidade Técnica de Apoio Orçamental da Assembleia da República disse ser essa uma falsa questão, apresentando custos para a recuperação total de todo o tempo de serviço de todas as carreiras especiais da função pública bem inferiores aos que o Ministério das Finanças invoca.

A propósito do decantado “equilíbrio das nossas contas públicas", Fernando Medina, em entrevista à TVI, disse recentemente: "O país não tem só professores”. Fernando Medina tem razão. O país não tem só os professores. Tem o escândalo da TAP (3.200 milhões) para pagar, os desmandos dos bancos (22.049 milhões, segundo números recentes do Tribunal de Contas) para amortizar, a Jornada Mundial da Juventude (80 milhões) para organizar, a Brisa (140 milhões) para compensar, a Ucrânia (250 milhões) para ajudar, mais, entre tantas outras “liberalidades”, os politicamente muito convenientes aumentos dos magistrados e juízes, de 2019, e as milionárias e imorais indemnizações de agora e do futuro, para continuar a “honrar”.

Mas, se não agora, quando perceberia o Governo que tem de fazer justiça?

*Professor do ensino superior

18/01/2023

Os habilidosos


no Público

18 de Janeiro de 2022

por Santana Castilho*

 

"Sabemos que nos mentem. Eles sabem que nos mentem. Eles sabem que nós sabemos que nos mentem. Nós sabemos que eles sabem que nós sabemos que eles nos mentem. E, mesmo assim, eles continuam a mentir."

Alexander Solzhenitsyn

1. A inesperada maioria absoluta do PS trouxe à governação o cheiro da decadência. Na Educação, a descolagem da realidade tornou a área nauseabunda. Para quem já viveu a implosão do guterrismo e do socratismo, a situação presente prenuncia fim idêntico.

Infelizmente, o debate sobre as questões da Educação só ocorre sob ondas de alarme e de urgência, quando as coisas começam a descambar gravemente e a paz podre fica ameaçada. É nessa altura que os políticos habilidosos acordam.

Considerando que os  pré-avisos das greves em curso foram enviados com a antecedência legalmente prevista, a haver algumas objecções ou dúvidas, era nessa altura que deveriam ter sido levantadas. Porquê só agora o Governo pede pareceres sobre a sua legalidade? O que podiam e deveriam ter feito os habilidosos António e João Costa, durante sete anos, tantos quantos levam de governo, para, com tempo, e não agora, que os professores se levantaram do chão, evitar os prejuízos aos alunos e às famílias, que hoje invocam para, uma vez mais, tentar virar a sociedade contra os professores?

2. Na intervenção de abertura de uma audição na Comissão Parlamentar da Educação, João Costa afirmou que “o Governo nunca propôs qualquer processo de municipalização do recrutamento de professores”. Tem razão o manipulador. O que o habilidoso propôs foi que, depois de recrutados os professores e colocados em “mapas intermunicipais”, seriam conselhos locais de directores, funcionando sob tutela de Comissões Intermunicipais e substituindo a graduação profissional e as preferências legitimamente manifestadas pelos candidatos por “perfis de competências” por eles concebidos, que definiriam os locais de trabalho dos novos escravos. Ou seja, o artista escolheu um trilho bem mais sinuoso, para chegar ao mesmo resultado, isto é, desvirtuar completamente o actual modelo de concursos. Este ministro é o cérebro duma pedagogia que substituiu ciência por crenças, que excluiu em nome da inclusão, que trocou rigor por facilitismo e que transformou um edifício sério num bazar de bugigangas. Este ministro é  um criador de  burocracia doentiamente controladora, que há sete anos vem, laboriosamente, escravizando os docentes portugueses.

O aceno patético aos manifestantes, em Coimbra, o discurso fantasioso aos directores, na Maia, ou a réplica ao que Sampaio da Nóvoa escreveu, certificaram um ministro definitivamente imprestável para gerir o caos que criou e incapaz de perceber que os protestos actuais são geneticamente diferentes dos anteriores.

3. O primeiro-ministro disse que os protestos resultam de “muito erro de percepção”, porventura de “uma contra-informação grande através da rede WhatsApp, dizendo que os presidentes de câmara é que passavam a contratar os professores, o que é absolutamente mentira”. “Quanto ao pessoal docente não há nenhuma competência a transferir para as câmaras. Isso é uma falsidade total”, também disse.

O erro é de percepção ou do que está escrito na Resolução do Conselho de Ministros n.º 123/2022, de 14 de Dezembro? Se lá está atribuída às CCDR (que resultam da vontade dos presidentes das câmaras) a incumbência de “acompanhar, coordenar e apoiar a organização e funcionamento das escolas e a gestão dos respetivos recursos humanos e materiais, promovendo o desenvolvimento e consolidação da sua autonomia “, a que devemos dar crédito? Ao que escreveu ou ao que disse António Costa?

E disse, ainda, ser essencial mudar um modelo de concurso que faz com que os professores andem “anos e anos com a casa às costas” até se vincularem. Que cara dura! Se assim pensa, por que nada fez  durante os últimos sete anos?

4. A nota enviada à comunicação social pela Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), apelando ao Governo para que decrete, “com urgência, serviços mínimos e adequados a que os alunos possam permanecer no interior da escola em condições de segurança e com o direito à refeição”, merece um esclarecimento.

Não existem serviços mínimos em Educação. Já uma vez foram ilegalmente decretados, mas o Tribunal da Relação reconheceu o abuso.

*Professor do ensino superior

 

16/01/2023

Santana Castilho na CNN-P

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https://cnnportugal.iol.pt/videos/este-ministro-e-um-artista-que-julga-que-os-outros-sao-uns-mentecaptos-que-nao-sabem-ler-nem-escrever/63c2a7770cf2665294d0c8ce?utm_source=facebook&utm_medium=social&utm_campaign=ed-cnnportugal&fbclid=IwAR32BqlyCYS6_7V0hl8byADYGNKCS2-hlujiF7k05EF63SF9v96-zbRJAfI

04/01/2023

A luta dos professores contra um governo poluto

 

in Público

4/1/2022

por Santana Castilho*

 

“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem”.

Bertolt Brecht

Em nove meses de governo, o resultado de uma maioria absoluta poluta e nepotista é uma pazada de demissões pelos mais escabrosos motivos e um ano lectivo que recomeçou num clima de conflitualidade como há muito não se vivia. Com efeito, na educação, o ambiente é de um profundo mal-estar, gerado por ondas de desorientação e deslumbramentos vazios de racionalidade, assentes em sucessivas torrentes de solicitações asfixiantes, sob nomes pomposamente modernos mas substantivamente inúteis,que tornaram num suplício o nobre acto de ensinar. 

Na acção deste governo é possível identificar padrões de comportamento político: quando as escolhas se revelam imprudentes, os autores não assumem a responsabilidade; quando as situações configuram escândalos, os responsáveis políticos rasgam as vestes para garantir que as desconheciam; quando os casos se acumulam, o líder da casta vocifera: habituem-se!

Sem subtilezas linguísticas, António Costa é o verdadeiro responsável por um governo poluto, que tem reduzido os professores a simples funcionários, cada vez mais desautorizados e despromovidos socialmente. 

António Costa deu campo aberto ao narcisismo político de aventureiros irresponsáveis e fez ouvidos de mercador ao que pensa a maioria dos professores de sala de aula sobre as madraças da flexibilidade e da inclusão, criadas para pastorear incautos e transformar velharias falhadas em tendências pedagógicas novas. 

António Costa é o verdadeiro responsável por, de modo cruel e perverso, ter posto a sociedade e a opinião pública contra os professores, para lhes retirar o direito à greve, para lhes retirar força salarialpara lhes roubar o tempo de trabalho cumprido. Com o seu cínico jeito, nomeou mordomos, que odeiam os docentes, em lugar de ministros, sem perceber que morre lentamente uma sociedade que não acarinha os seus professores. Agora,finalmente, tem os docentes na rua a lutar contra diversas fidalguias partidárias (sindicalismo tradicional incluído) e a reclamar o direito de ensinar em paz, antes que acabem, definitivamente, abandonados num país onde o acto pedagógico livre se transforme em prática administrativa ou obediência doutrinária

O que, na senda dos anteriores, reconheçamos, os governos de António Costa fizeram foi tão miserável e tirânico que os professores se sentiram, finalmente, convocados para dizer não a anos de decisões catastróficas para o ensino público. Agora, das duas, uma: ou os professores ganham ou o país perde. Porque o Costa, João, autor material, com o alheamento do Costa, António, autor moral, têm vindo a promover o lento homicídio do ensino público e a pôr em causa o futuro das crianças e dos jovens alunos portugueses. Porque a pedagogia e as didácticas assentes na ciência são distintas das proclamações de João Costa e prosélitos, assentes em dogmas fanáticos. 

Muitas críticas à greve dos professores parecem não lhes reconhecer o direito à luta por melhores condições de trabalho e pela retoma da dignidade profissional e esquecer que a greve é um instituto de manifestação de descontentamento, constitucionalmente consagrado na nossa democracia representativa. Por outro lado, para que a democracia seja mais do que apenas formalmente representativa, qualquer governo deve permanecer aberto e atento à expressividade das greves. Só assim o exercício da apregoada “soberania do povo” ganha sentido durante os quatro anos que separam os ciclos eleitorais. 

Por tudo isto, os professores precisam hoje da solidariedade dos pais. Porque não há futuro para os seus filhos sem educação, não há educação sem ensino público e não há ensino público sem professores dignificados. Por tudo isto, os pais não podem deixar os professores a lutar sozinhos. Todavia, temos uma comunidade parental que tem ficado passiva perante o rasto de destruição do ensino público, porque ainda não compreendeu como tem sido gerida a educação, particularmente na esfera pública. Espero bem que sejam agora muitos os pais portugueses que passem a compreender como a luta dos professores é, também, uma luta pelo futuro dos seus filhos.

 

*Professor do ensino superior

21/12/2022

E o mentiroso é André Pestana?


Em declarações ao Público, o ministro da Educação acabou a apelidar André Pestana de “mentiroso”. Em entrevista ao programa 360 da RTP3, a que o Público igualmente se referiu, João Costa apontou como uma das razões para a manifestação de sábado passado a “campanha de mentiras” que circulou pelas redes sociais, dando conta de que os professores iriam passar a ser contratados pelas câmaras municipais, e voltou a afirmar que “o dirigente sindical que convocou esta manifestação estava determinado a mentir”. Ainda ao Público, André Pestana disse que o ministro "vai ter de responder na justiça" pelo insulto. 
 
Senhor ministro, junto-me gostosamente aos seus leais conselheiros para ser sua testemunha desabonatória. O senhor tem razão, porque:
- Não é verdade que a mobilidade interna tenha acabado. Como o senhor sabiamente esclareceu, com a clareza que lhe conhecemos, “sempre que há lugares de quadro a concurso, qualquer professor de carreira pode concorrer”. Coisa diferente é o sítio onde vai trabalhar. Esse, são os venerandos directores que vão decidir. Imbatível a sua verdade!
- Não é verdade que desaparece a lista ordenada nacional, porque o senhor já jurou pela sua virgindade que “a ocupação de um lugar de quadro teve e terá sempre como primeiro critério a graduação profissional do professor”. Coisa diferente é o segundo critério, o dos directores, que decidirão onde cada professor vai trabalhar. Cristalina a sua maneira de colocar os pontos nos ii!
- Doeu o puxão de orelhas que nos deu quando nos disse que a “DGEstE não tem competências na área de gestão do pessoal, pelo que as não pode transferir para as CCDR”. Tem razão! Quem o disse foi a Resolução 123/2022 do Conselho de Ministros. Bem visto! Uma coisa é um lobito, outra coisa é uma alcateia!
- Tal como disse, não é verdade que a gestão dos professores passe para as câmaras municipais. Ela já passou para as comunidades municipais … que agregam as câmaras municipais. Este seu fino talento bocagiano reconduziu-me ao episódio da flatulência da cortesã, que Bocage tão sagazmente disfarçou. Até o cheiro senti!
 
- Já que estamos no capítulo dos “descuidos”, deixe-me dizer que apenas sujou a folha das suas verdades com a entrevista que deu à RTP3, na noite da manifestação. Aquilo não foi um “descuido”. Foi uma diarreia. Então foi proclamar, urbi et orbi, que 30 mil licenciados, mestres ou doutores, são tão desprovidos de inteligência que ficam à mercê da manipulação de um reles sindicalista? Que não passam de um bando de totós, que gastam dinheiro para vir a Lisboa dizer que o mentiroso é o senhor, incapazes de discernir entre a sua luz e as trevas dele? Já viu o tiro que deu nos seus pezinhos, quando colou um selo de mentecapto na testa de cada um dos 30 mil que protestaram no sábado? Logo o senhor, que há sete anos os louva, protege e acarinha e por cuja felicidade reza todos os dias!
 
- Tudo visto, o senhor é um avançado mental. Teve razão antes de tempo, quando estabeleceu uma parceria com a vetusta Gulbenkian, para ensinar emoções aos professores. Com tamanhas excitações entre a verdade e a mentira, a realidade e o imaginário, quem iria resistir, não fora a sua prognose?
 
Desçamos à terra.
Nas vésperas do que viria a ser uma grande manifestação de professores, já bem num final de dia, foi enviado um e-mail aos directores dos agrupamentos, para cujo conteúdo se pedia o urgente conhecimento dos professores. Tratava-se de esclarecimentos, sob forma de pergunta/resposta, já antes prestados, note-se, relativos às anunciadas mudanças no regime de concursos de recrutamento de docentes. Com o ministerial espírito em Paris, embrenhado na preparação de mais uma homilia da OCDE, o que denotava a pressa da estranha missiva, feita a “pedido do senhor ministro”? Obviamente, o nervosismo que nascia na mente capta do senhor ministro, ante o que aí vinha. E veio! Cerca de 30 mil, na rua, a acenarem-lhe com lenços brancos de despedida.
 
No mínimo, faça agora como o outro Costa, que não apareceu nas cheias e fez-se de morto na discussão sobre a eutanásia. Feche-se numa bolha, fazendo figas para que não rebente.
No máximo, ainda tem uma réstia de dignidade ao alcance: demita-se!
 
In "Público" de 21.12.22

 

18/12/2022

A minha comunicação aos Colegas no início da memorável manifestação de 17.12.22

A minha comunicação aos Colegas no início da memorável manifestação de 17.12.22
 
Estimados Colegas:
 
Que privilégio, sentir-me parte desta verdadeira epifania, que hoje vivemos, porque nós, professores livres, começámos a demonstrar que há muros que podem ser derrubados, para melhorar o nosso presente e o futuro dos nossos alunos.
 
Do meu posto de observação sigo, há 17 anos (13 da responsabilidade do PS, 4 da responsabilidade do PSD), as decisões da política educacional mais rasteira que me foi dado conhecer depois de Abril.
E porque é mau que percamos a memória colectiva, permitam-me que faça uma breve síntese destes anos de desespero:
- Instalou-se um desrespeito galopante pela actividade docente, eminentemente intelectual e livre, como se ela pudesse ser exercida por operários vergados a obediências de pacotilha e aos desmandos de quem manda.
- Perdeu-se a generosidade com que tantos professores se entregavam voluntariamente a actividades, fora dos seus horários profissionais, porque nelas reconheciam transferências reais para a educação dos seus alunos e para a resolução dos problemas sociais.
- Destrui-se tempo livre, tempo para estudar e pensar, para acolher o monstro da burocracia escravizante, personificada por plataformas e protocolos administrativos, paridos por pequenos déspotas, verdadeiros tiranos acéfalos, com pedras onde os outros têm coração.
- Fecharam-se escolas aos milhares, Portugal interior fora.
- A gestão das escolas, que antes era verdadeiramente eleita e por isso democrática, deu lugar a uma gestão predominantemente autocrática, onde o medo das represálias que as discordâncias acarretam se tornou o clima organizacional dominante.
- A natureza axiológica da Educação foi paulatinamente substituída por regras de mercado, cada vez mais circunscritas a objectivos utilitários e instrumentais.
Nos nossos dias, o discurso de João Costa e prosélitos assenta na retórica provinciana do “aluno do século XXI”, do “trabalho de projecto”, do “trabalho em rede” e dos “nados digitais”. Quando se juntam hoje as “aprendizagens essenciais” ao estribilho da “flexibilidade pedagógica”, vemos o que a música de João Costa deu: um desconcerto nacional, particularmente para os que já chegam à Escola marcados pela sorte madrasta de terem nascido em meios desfavorecidos. Porque a inovação pedagógica do aprender menos não remove o insucesso. Mascara-o. Porque os experimentalismos assentes no abaixamento de fasquias não puxam pelos que ficam para trás. Afundam-nos.
Das celebrações fátuas de João Costa sobressai o decantado tema da educação inclusiva. Ter todos dentro da mesma escola é um excelente princípio, que nenhum civilizado contesta. Mas não o concretizamos fingindo que determinados alunos podem dar respostas que sabemos que nunca poderão dar, pedindo do mesmo passo aos restantes que fiquem parados. É isto que João Costa tem promovido: uma exclusão dupla, mais gravosa ainda para os que nasceram diferentes. Aproximadamente metade dos alunos sinalizados como carentes de “medidas selectivas ou adicionais” (novilíngua oficial) não tem apoio directo de professor especializado. Para satisfazer o falso conceito de inclusão vigente, basta que passem mais de 60% do tempo lectivo numa sala de aula, com os colegas de turma. Pouco importa que nada entendam do que lá é dito ou feito. A ordem para que passem de ano atira as suas taxas de sucesso para cima dos 90%. Falta medir os seus índices de sofrimento e de impreparação para a vida.
Temos hoje, convenientemente, já se vê, um processo de formação contínua de professores, cuja característica distintiva é torná-los radicalmente cegos para tudo o que se oponha à narrativa da pedagogia religiosa do pequeno ministro e dos seus lobitos. As crenças substituíram o conhecimento e o poder decisório está nas mãos de uma seita. Fanáticos que são, estigmatizam e eliminam os que recusam juntar-se ao rebanho.
João Costa está, há 7 anos, laboriosamente, a desregular todo o mecanismo de avaliação do sistema de ensino, anulando a comparabilidade dos dados recolhidos ao longo dos tempos, a desconstruir a estrutura curricular e a produzir normativos sobre o que deve ser feito no âmbito da autonomia das escolas, promovendo, assim, o mais hipócrita homicídio, à nascença, dessa mesma autonomia. As fotos que o representam vestido de escuteiro e uns números giros de filosofia Ubuntu e avaliação MAIA dão-lhe a credibilidade dos vendilhões do Templo. Falta agarrar no chicote para expulsar este sacrista do nosso convívio.
Como permitimos tudo isto?
Em minha opinião porque os professores mergulharam num limbo, onde cresceu o cansaço e a resignação. O desânimo que os assolou radicou na impotência dos sindicatos para os defender das decisões tirânicas do Governo. Com efeito, os sindicatos têm persistido na representação do papel de lamuriosas vítimas enganadas e as lutas sindicais têm sido cada vez mais aprisionadas pelos interesses das conjunturas partidárias e cada vez menos centradas na eficácia da defesa dos interesses profissionais dos seus representados. Os sindicatos têm sistematicamente fugido das lutas que provocariam mudanças nas relações de poder. Por acomodação, medo reverencial e iniciativa nula.
Em minha opinião porque as nossas organizações sindicais se foram transformando em albergues de inutilidades, enquanto o quotidiano dos professores se foi tornando cada vez mais penoso. Porque em lugar de promover avanços nas condições de trabalho dos professores, os sindicatos do sistema se foram contentando, apenas, com atrasar os retrocessos.
Porque se instituiu um modus operandi que se repetiu ao longo dos anos. Primeiro apresentam-se cenários horríveis. Depois vive-se um ritual hipócrita de prolongadas e falsas negociações e caricaturais protestos (abaixo-assinados, cordões humanos, marchas, vigílias e demais diletâncias). No fim, o ministério ganha e os sindicatos também: o primeiro por ter pregado mais um prego no nosso caixão; os segundos por terem “evitado o pior”, expressão laudatória das suas sucessivas vitórias de Pirro. Só os professores têm perdido. Perdido sempre, desde 2005!
E sendo a gestão da percepção pública um importante instrumento político, João Costa tem tido, nesta ineficaz oposição sindical, um instrumento importante para disfarçar a mediocridade da sua acção e manipular à vontade a opinião pública. Quando lhe ouvi o topete, na última sexta-feira, de acusar o nosso Colega André Pestana de não dizer a verdade, o meu pensamento voou para Alexander Solzhenitsyn, que magistralmente caracterizou, assim, situações idênticas à que ora vivemos:
"Sabemos que nos mentem. Eles sabem que nos mentem. Eles sabem que nós sabemos que nos mentem. Nós sabemos que eles sabem que nós sabemos que eles nos mentem. E, mesmo assim, eles continuam a mentir."
Mas aqui estamos, finalmente a resistir, a levantar-nos do chão e a dizer não!
Não à proposta ministerial para alterar o regime de recrutamento e mobilidade dos professores!
Não à selecção de professores por conselhos locais de directores!
Não à substituição de quadros por mapas!
Não às 23 comunidades intermunicipais!
Não ao desaparecimento da natureza nacional dos concursos e da mobilidade interna dos professores!
Não à remoção da habilitação profissional para o desempenho da actividade docente!
Não à perda do direito inaliável de escolher o local onde se trabalha!
Não a uma engenharia de gestão, que subordina os mais elementares direitos, humanos dos professores e à educação dos alunos, aos mais mesquinhos interesses da austeridade da página virada.
Não à transformação do regime da Mobilidade por Doença num concurso canalha e desumano, que atirou para a sargeta da vida os professores mais frágeis e as suas famílias, negando-lhes direitos constitucionalmente protegidos!
Não ao roubo do tempo de serviço efectivamente prestado!
Não à desregulação sistemática dos horários de trabalho!
Não às vagas e quotas para progressão na carreira!
Não à iniquidade da Avaliação do Desempenho!
Não à precariedade!
Não à recusa de instituir um regime específico de aposentação, que permita o rejuvenescimento da profissão!
Não à substituição de pessoas por algoritmos!
Apaziguada que está a raiva que me foi crescendo nos dentes ao longo destes 17 anos de magistratura de ministros ignorantes, deixem-me terminar, abraçando-vos com palavras. Palavras que vêm do fundo do meu coração. Palavras de reconhecimento e gratidão pela obra que os professores portugueses ergueram em 48 anos de democracia.
Olha, Professor ofendido:
Se eu fosse músico, apanhava todos os sons do riso das crianças, mais os gritos de raiva que abalam a injustiça, o bater do coração que finalmente alcança, juntava tudo num cantar de esperança e, neste dia, enchia com ele o ar à tua volta.
Mas, sabes bem, eu sou apenas mais um…
Podia ser pintor e agarrar o Sol, o Mar e o Voo, meter-lhes dentro a alma da tua Escola, marcá-los com o brilho dum olhar – claro como gelo ao sol do despertar, quente como fogo a arder no peito de quem vive - e encher com as suas cores o espaço do teu mundo.
Mas, sabes bem, eu sou apenas mais um…
Se eu fosse escritor, sim! Inventava as palavras que dizem a Justiça por que anseias – desde a raiz da Vida até ao fim do Tempo –, as mesmas palavras que dizem Liberdade e Razão, e com essas palavras que inventasse, fazia da Vida que constróis o teu Poema.
Mas, sabes bem, eu sou apenas mais um…
Mais um que resiste! Mais um que não desiste! Mais um que está convosco até ao fim! Até vencermos!
Vivam os Professores!
Vivam os nossos alunos!