- blogue de homenagem ao Professor Santana Castilho - uma retribuição (bem pequena) pelo muito que tem feito em defesa dos professores e da Escola Pública.
29/04/2023
Pela educação e pela liberdade
12/04/2023
Estamos apenas a mascarar o falhanço
no Público
12 de Abril de 2023
por Santana Castilho*
Os professores foram os obreiros de um tão justo quão ímpar protesto social nos últimos seis meses, tanto mais significativo quanto conta com uma maioritária concordância dos portugueses, expressa em sondagens. Em resposta, o Governo quer impor a sua vontade, sem acordo, via um primeiro decreto-lei. E trabalha agora no desenho de um segundo, dito de recuperação de tempo de serviço. Tudo com imoral indiferença pelos professores.
A força da união entre professores, independentemente de filiações partidárias ou sindicais, foi, até agora, irrelevante para a obtenção de resultados. Os “negociadores” sindicais foram, até agora, simples actores de liturgias destinadas a terminar com a imposição da vontade do Governo. Mário Nogueira foi, neste sentido, tristemente lapidar, à saída da reunião do passado dia 5, quando felicitou o Ministério da Educação por lhe conceder mais oportunidades de prolongar a farsa.
Há muito que os sindicatos deviam ter adoptado iniciativas diferentes das que têm usado e se têm revelado ineficazes. Há muito que os sindicatos deviam ter abandonado reuniões de negociação onde são vexados e simplesmente tratados como idiotas úteis, obedientes e previsíveis. E se acima citei Mário Nogueira foi apenas por ter sido ele quem explicitou o que critico. Mas fica claro que a minha crítica engloba o S.TO.P., que afinal apenas se contentou com um lugar à mesa.
O estado da Educação transparece em pleno da (falta de) qualidade das negociações em curso. Com outros protagonistas, a crise da escola pública poderia ser o ponto de partida para uma discussão séria sobre o futuro da Educação. No entanto, tudo não passa do cumprimento de uma exigência legal, repito, que deve preceder o momento em que o Governo impõe a sua vontade. Deste modo, não é possível resolver problemas, mas tão-só agravá-los e empurrá-los para a frente. Deste modo, há uma realidade que tem de ser encarada: os sindicatos estão apenas a mascarar o falhanço.
O decreto-lei que modifica todo o processo de recrutamento e vinculação de professores já está em Belém, para promulgação. O diploma em análise, que só piora o mau que já estava em vigor, tem dois objectivos, a saber:
1. Evitar, manhosamente, após a intimação da Comissão Europeia, de Julho passado, que o Tribunal Europeu de Justiça se pronuncie sobre as políticas discriminatórias do Estado português em matéria de contratação de professores.
2. Atamancar, de qualquer jeito e sem respeito pelo direito dos professores a terem uma vida familiar minimamente estável, a caótica falta de docentes para assegurar o ensino obrigatório, fruto da incompetência dos governantes para lidarem com um problema há anos previsto.
A chamada “vinculação dinâmica” é uma oferenda de Pirro, perpetrada por um Maquiavel de pacotilha, que propõe uma separação coerciva, permanente e cruel de milhares de professores das respectivas famílias.
A este diploma vai brevemente juntar-se um outro, que consignará a correcção das chamadas “assimetrias na progressão da carreira”. Só que, de cada vez que o Ministério da Educação se propõe corrigir asneiras anteriores, novos disparates promove. O anunciado “acelerador” para resolver assimetrias provocadas pelo congelamento da carreira docente é antes um exclusor de muitos professores e um gerador de novas injustiças. A defesa que o ministro faz da sua proposta não expõe apenas a incompetência técnica. Revela a sua lamentável desonestidade intelectual.
Os olhares viram-se agora para Belém. O Presidente da República promulga ou veta os diplomas? Ele próprio declarou que recebeu contributos de muitos professores e que aguarda que o Governo responda a dúvidas e perguntas que formulou. Duvido que os vete. Mas, se os promulgar, assina uma carta de alforria para destruir milhares de famílias. A propósito, recorde-se que, em Dezembro passado, em Ourém, Marcelo disse que os professores se queixavam com razão. E reiterou essa razão quando, na entrevista de Março à RTP, foi bem explícito a defender que o Governo devia acordar com os sindicatos um modo de recuperar o tempo de serviço, se não integralmente, pelo menos de forma parcial.
*Professor do ensino superior
29/03/2023
Todo o poder só se constrói sobre o consentimento dos que obedecem
no Público
29 de Março de 2023
por Santana Castilho*
1. Depois de meses de continuada contestação, os professores apenas reforçaram a sua coesão e ganharam apoio público. São resultados exíguos, que sugerem a pergunta: acabarão os professores por cumprir imposições injustas, que os derrotam?
Se há coisa que se afigura clara para quem vem acompanhando a conduta do ministro da Educação nas negociações com os sindicatos é que as reduz a rituais fadados a epílogos coercivos, sob forma de decretos-lei, que não acolhem as pretensões mais importantes dos docentes. Assim sendo, parece evidente que só novas formas de luta poderão retirar os professores do impasse em que estão.
Ao longo dos anos foram crescendo diversas hierarquias de dominância (administrativas, pedagógicas, disciplinares, sindicais, políticas) no sistema de ensino, que desenvolveram nos professores uma tendência para simplesmente obedecer (mesmo discordando e reclamando) aos que detêm cargos de poder. Foram muitos anos de condescendência, ora por comodismo, ora por falta de opinião suficientemente formada sobre o que, em circunstâncias particulares, protege a desobediência. Com efeito, o problema maior da obediência é o de sabermos até que ponto é legítimo desobedecer.
Se olharmos para a história do pensamento humano, é forçoso reconhecer que muitos dos acontecimentos que promoveram o desenvolvimento e o progresso das sociedades radicaram em actos de desobediência. Por outro lado, sabemos que quanto maior é a coesão dentro de um grupo, mais fácil se torna resistir e desobedecer às pressões que o agridem. É este o momento ímpar, de uma fortíssima coesão entre os docentes, que ora se vive. Luís Costa, um dos professores mais abnegados da nossa classe, entendeu-o e convidou os colegas a assumirem publicamente o compromisso de desobedecerem à prestação de serviços mínimos ilegais. Fê-lo com um texto bem fundamentado em várias disposições legais e no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 10.10.18, que declarou ilegais os serviços mínimos anteriormente determinados para greves às avaliações finais. Oxalá muitos o sigam, para que as coisas mudem e a Educação ganhe.
2. As perplexidades subjacentes ao que acabo de escrever ficaram patentes no que acabou por ser a primeira reunião da nova ronda negocial, com uma ordem de trabalhos circunscrita aos seguintes temas: correção dos chamados “efeitos assimétricos” sobre a carreira docente, decorrentes do período de congelamento; redução da burocracia nas escolas; correção da desigualdade na redução da componente letiva relativa à monodocência; regularização de vínculos de Técnicos Superiores e Técnicos Especializados sem funções de formação; apresentação de calendário negocial. Se é evidente que esta agenda deixa de fora o que é mais importante para o futuro da escola pública, a análise dos detalhes das primeiras propostas do ministro expõe a inutilidade do que se seguirá. Retomo a pergunta de partida: acabarão os professores por cumprir imposições injustas, que os derrotam?
3. Das diferentes áreas da governação, a imagem que perdura é a de que quem manda não sabe o que fazer.
Acentuaram-se as desigualdades e cresceu o número de famílias profundamente afectadas pela queda do rendimento real, provocado pelo aumento dos preços dos bens de primeira necessidade.
Sem que disso se fale, reformados e pensionistas da Caixa Geral de Aposentações sofrerão cortes em 2024.
Enquanto o ministro da Saúde justifica a falta de comida no Hospital de Santa Maria com o estranho argumento de que a alimentação não é uma prioridade nas urgências, António Costa dá, em Santarém, 43 milhões de euros a projeto para passarmos a comer insectos.
Depois de uma semana de inusitada guerra aberta em torrão luso, Marcelo e Costa, então na República Dominicana, vestidos de igual, com uma espécie de bibe branco, mudaram o registo do fala-fala dispensável para modo de reality show de afagos e elogios mútuos. Sofreu a credibilidade de ambos e a qualidade da vida pública que nos oferecem.
Não vão bem a democracia, a liberdade e a paz social. Que bem nos faria, se todos reflectissemos sobre o alcance do título deste escrito: todo o poder só se constrói sobre o consentimento dos que obedecem.
*Professor do ensino superior
15/03/2023
Os professores entre a consciência e a lei
Os professores entre a consciência e a lei
Santana Castilho*
1. Como se esperava, terminou sem acordo a reunião suplementar entre o Ministério da
Educação e os sindicatos. O que se segue? A promulgação de um diploma que colocará
milhares de professores, contra a sua vontade, a centenas de quilómetros de casa, dificultará
ainda mais os mecanismos de aproximação à residência e conferirá aos directores o poder de
afastar os professores incómodos, mesmo que sejam do quadro. Numa palavra, passará a
vigorar um normativo que só piora o que já estava em vigor.
E seguem-se novas reuniões negociais para debater a recuperação do tempo de serviço. Mas
sobre a matéria, João Costa já esclareceu que as próximas negociações não se ocuparão da
recuperação do tempo de serviço de todos os professores, mas sim das compensações
(“correcção dos efeitos assimétricos”, no dizer do ministro) a atribuir aos que tenham sido
mais prejudicados durante o congelamento das carreiras.
Aquilo que o ministro agora apoda de “efeitos assimétricos” é uma epígrafe maliciosa para
uma ideia racionalmente sem nexo e eticamente desprezível. Limpando-a dos floreados
palavrosos do ministro, o que ela significa é isto: João Costa vai entrar, mais uma vez de má-fé,
numa negociação viciada, porque já tem o resultado antecipadamente determinado, qual seja
distribuir umas migalhas a uns e discriminar os restantes. Como se não tivessem trabalhado
todos, João Costa propõe-se promover ultrapassagens indecorosas, com um confrangedor
desprezo pela justiça mínima.
2. Duas sondagens recentes e a observação simples dos factos expõem o fracasso da estratégia
de manipulação da opinião pública promovida pelo Governo e, particularmente, por João
Costa, no contencioso com os professores. Mas, no domínio dos resultados, João Costa levou a
dele avante: a sua política ruinosa avançou e um péssimo decreto-lei vai ser aprovado num
Conselho de Ministros inerte ante a destruição do sistema nacional de ensino e da escola
pública.
A união genuína dos professores e a abnegação com que se entregaram a manifestar
publicamente a sua repulsa pelas políticas nefastas de que são vítimas não demoveram um
ministro desumano e incompetente. Daí a pergunta que se impõe: que fazer agora?
Talvez reflectir sobre a forma como Peter Singer aborda, no seu livro “Ética Prática”, a relação
entre a consciência individual e a lei. A dado passo, o autor formula esta pergunta:
“Temos alguma obrigação moral de obedecer à lei, quando a lei protege e sanciona coisas que
achamos totalmente erradas?”.
E Peter Singer responde a si próprio pela escrita de Henry Thoreau, assim:
“Terá o cidadão de entregar a sua consciência ao legislador, nem que seja por um só momento
ou no grau mínimo? Para que terá então todo o homem uma consciência? Penso que devemos
ser em primeiro lugar homens e só depois súbditos. A única razão que tenho o direito de
assumir é a de fazer sempre aquilo que penso ser justo”.
Posto isto, que bela lição dariam os professores a João Costa se o deixassem a falar sozinho
com o diploma que vai levar a Conselho de Ministros e nem um só dos contratados
concorresse à pérfida vinculação dinâmica! A que outra artimanha recorreria o criativo
ministro, para não ser levado ao Tribunal de Justiça da União Europeia, por incumprimento da
correlata Directiva 1999/70/CE?
3. A realização das provas de aferição em suporte digital é um processo que começa a revelar-
se como de princípio era de prever: sem computadores suficientes, sem estruturas de base
(rede eléctrica e de Internet preparadas e adequadas nas escolas) e muitos alunos
insuficientemente familiarizados com as rotinas informáticas, não passa de uma iniciativa de
novos-ricos irresponsáveis. O irrealismo (Projecto de Desmaterialização das Provas de
Avaliação Externa) terminará, antecipo, atribuindo, como é habitual, a culpa do fracasso às
escolas e à falta de formação dos professores.
A esta vertente operacional acresce a mais importante, sobre a qual venho a escrever, de há
muito: sendo a utilização do digital desejável e incontornável, não deve ser impulsionada por
dogmas políticos, antes com a consideração dos avanços científicos no domínio das
neurociências, particularmente da psicologia cognitiva. E esses avanços permitem expor a
pobreza pedagógica e a limitação de exames assentes em escolhas múltiplas.
*Professor do ensino superior
01/03/2023
As mercês pouco sérias de João Costa
15/02/2023
Se não agora, quando?
no Público
15 de Fevereiro de 2023
por Santana Castilho*
Em protesto contra um vasto número de questões que se foram acumulando, sem resposta, ao longo de sucessivos governos e anos, há mais de dois meses que estão activas greves no sector da Educação. Neste período, ocorreram quatro grandes manifestações em Lisboa e muitas mais por todo o país. Analisando o fenómeno, não importa sob que ângulo, é forçoso reconhecer que ele só é explicável por haver uma genuína, verdadeiramente espontânea rejeição dos professores relativamente às políticas que lhes têm sido impostas.
Se descermos ao detalhe, as causas mais próximas são, entre outras, uma crescente falta de professores, de professores de educação especial e psicólogos, de pessoal não docente, queixas relativas ao facilitismo e à indisciplina galopantes, ao aumento exponencial da inútil sucata burocrática, à precariedade, às regras abusivas que dificultam a progressão na carreira, ao desadequado e iníquo modelo de avaliação do desempenho, à extorsão de tempo de serviço, a salários baixos, ao tratamento desumano dispensado aos professores velhos e doentes e ao menosprezo pelos alunos mais vulneráveis, em nome de uma “inclusão” que exclui.
Se virmos de cima, é afinal a escola mínima, amputada de conhecimento e orientada para formar cidadãos disponíveis para aceitar trabalho apenas remunerado com salário mínimo, que os professores contestam. É este ensino público para os pobres, enquanto os ricos fogem para os melhores colégios privados, que os professores rejeitam.
Com efeito, passaram-se sete anos sob influência de uma ideologia pedagógica que reduziu os professores a meros receptores de directivas para produzir sucesso martelado e certificar a ignorância. Sete anos de uma propaganda que fala da geração mais preparada de sempre, quando apenas se trata, coisa bem diferente, da geração que mais tempo permaneceu, obrigatoriamente, na escola. Ora se houvesse dúvidas sobre a determinação dos professores em romper com o estado a que chegou o sistema de ensino, elas foram varridas pela gigantesca manifestação de sábado passado.
Aqui chegados, subsiste a dúvida maior: estará, finalmente, o Governo consciente de que tem de negociar ou, outrossim, continuará com a esperança, como maliciosamente o Presidente da República sugeriu, em que "há um momento em que a simpatia, que de facto há na opinião pública em relação à causa dos professores, pode virar-se contra eles"?
Se prevalecer a primeira hipótese, que me parece imperiosa e a única admissível, o Governo tem de negociar com seriedade, remover o seu descolamento da realidade, até aqui patenteado, corrigir a inércia para responder à crise e aceitar que o problema da recuperação do tempo de serviço não pode ser iludido. Tem custos? Naturalmente que sim. Mas os sindicatos já se manifestaram receptíveis a dilui-los ao longo de vários anos e a soluções parciais, para quem por elas opte, de traduzir parte deles em tempo válido para efeito de reforma. Tudo por forma a não prejudicar o equilíbrio das contas públicas. Por outro lado, importa recordar que, já em 2019, a Unidade Técnica de Apoio Orçamental da Assembleia da República disse ser essa uma falsa questão, apresentando custos para a recuperação total de todo o tempo de serviço de todas as carreiras especiais da função pública bem inferiores aos que o Ministério das Finanças invoca.
A propósito do decantado “equilíbrio das nossas contas públicas", Fernando Medina, em entrevista à TVI, disse recentemente: "O país não tem só professores”. Fernando Medina tem razão. O país não tem só os professores. Tem o escândalo da TAP (3.200 milhões) para pagar, os desmandos dos bancos (22.049 milhões, segundo números recentes do Tribunal de Contas) para amortizar, a Jornada Mundial da Juventude (80 milhões) para organizar, a Brisa (140 milhões) para compensar, a Ucrânia (250 milhões) para ajudar, mais, entre tantas outras “liberalidades”, os politicamente muito convenientes aumentos dos magistrados e juízes, de 2019, e as milionárias e imorais indemnizações de agora e do futuro, para continuar a “honrar”.
Mas, se não agora, quando perceberia o Governo que tem de fazer justiça?
*Professor do ensino superior
18/01/2023
Os habilidosos
no Público
18 de Janeiro de 2022
por Santana Castilho*
"Sabemos que nos mentem. Eles sabem que nos mentem. Eles sabem que nós sabemos que nos mentem. Nós sabemos que eles sabem que nós sabemos que eles nos mentem. E, mesmo assim, eles continuam a mentir."
Alexander Solzhenitsyn
1. A inesperada maioria absoluta do PS trouxe à governação o cheiro da decadência. Na Educação, a descolagem da realidade tornou a área nauseabunda. Para quem já viveu a implosão do guterrismo e do socratismo, a situação presente prenuncia fim idêntico.
Infelizmente, o debate sobre as questões da Educação só ocorre sob ondas de alarme e de urgência, quando as coisas começam a descambar gravemente e a paz podre fica ameaçada. É nessa altura que os políticos habilidosos acordam.
Considerando que os pré-avisos das greves em curso foram enviados com a antecedência legalmente prevista, a haver algumas objecções ou dúvidas, era nessa altura que deveriam ter sido levantadas. Porquê só agora o Governo pede pareceres sobre a sua legalidade? O que podiam e deveriam ter feito os habilidosos António e João Costa, durante sete anos, tantos quantos levam de governo, para, com tempo, e não agora, que os professores se levantaram do chão, evitar os prejuízos aos alunos e às famílias, que hoje invocam para, uma vez mais, tentar virar a sociedade contra os professores?
2. Na intervenção de abertura de uma audição na Comissão Parlamentar da Educação, João Costa afirmou que “o Governo nunca propôs qualquer processo de municipalização do recrutamento de professores”. Tem razão o manipulador. O que o habilidoso propôs foi que, depois de recrutados os professores e colocados em “mapas intermunicipais”, seriam conselhos locais de directores, funcionando sob tutela de Comissões Intermunicipais e substituindo a graduação profissional e as preferências legitimamente manifestadas pelos candidatos por “perfis de competências” por eles concebidos, que definiriam os locais de trabalho dos novos escravos. Ou seja, o artista escolheu um trilho bem mais sinuoso, para chegar ao mesmo resultado, isto é, desvirtuar completamente o actual modelo de concursos. Este ministro é o cérebro duma pedagogia que substituiu ciência por crenças, que excluiu em nome da inclusão, que trocou rigor por facilitismo e que transformou um edifício sério num bazar de bugigangas. Este ministro é um criador de burocracia doentiamente controladora, que há sete anos vem, laboriosamente, escravizando os docentes portugueses.
O aceno patético aos manifestantes, em Coimbra, o discurso fantasioso aos directores, na Maia, ou a réplica ao que Sampaio da Nóvoa escreveu, certificaram um ministro definitivamente imprestável para gerir o caos que criou e incapaz de perceber que os protestos actuais são geneticamente diferentes dos anteriores.
3. O primeiro-ministro disse que os protestos resultam de “muito erro de percepção”, porventura de “uma contra-informação grande através da rede WhatsApp, dizendo que os presidentes de câmara é que passavam a contratar os professores, o que é absolutamente mentira”. “Quanto ao pessoal docente não há nenhuma competência a transferir para as câmaras. Isso é uma falsidade total”, também disse.
O erro é de percepção ou do que está escrito na Resolução do Conselho de Ministros n.º 123/2022, de 14 de Dezembro? Se lá está atribuída às CCDR (que resultam da vontade dos presidentes das câmaras) a incumbência de “acompanhar, coordenar e apoiar a organização e funcionamento das escolas e a gestão dos respetivos recursos humanos e materiais, promovendo o desenvolvimento e consolidação da sua autonomia “, a que devemos dar crédito? Ao que escreveu ou ao que disse António Costa?
E disse, ainda, ser essencial mudar um modelo de concurso que faz com que os professores andem “anos e anos com a casa às costas” até se vincularem. Que cara dura! Se assim pensa, por que nada fez durante os últimos sete anos?
4. A nota enviada à comunicação social pela Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), apelando ao Governo para que decrete, “com urgência, serviços mínimos e adequados a que os alunos possam permanecer no interior da escola em condições de segurança e com o direito à refeição”, merece um esclarecimento.
Não existem serviços mínimos em Educação. Já uma vez foram ilegalmente decretados, mas o Tribunal da Relação reconheceu o abuso.
*Professor do ensino superior