27/12/2018

TVI 24. 21ª Hora

 Santana Castilho·Quinta-feira, 27 de dezembro de 2018 (Facebook)

Aqui fica o link para uma conversa com o jornalista José Alberto Carvalho, sobre o problema da contagem do tempo de serviço dos professores e não só:

https://tviplayer.iol.pt/programa/21-hora/55d74f360cf2cfab91830ad8/video/5c2400110cf24b98d357fbc9?jwsource=fb&fbclid=IwAR1KoEeDA1vEGWfznT6o84UQklwSnBq5pwniF47Y4rLmj7PiphIsVDMOoBA

26/12/2018

O Natal dos professores

no Público
26/12/2018

por Santana Castilho*

1. Depois de várias manobras pouco abonatórias, a AR aceitou a Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) para contagem de todo o tempo de serviço prestado pelos professores. Reitero o apreço pelo trabalho dos proponentes. Romper o ciclo da democracia fechada e enquistada nos diferentes aparelhos, abrindo uma fresta diferente de participação, é obra e merece cumprimento.

E agora? Agora, nem que Cristo desça à Terra, o chumbo está garantido. Com efeito, a AR não pode impor normativos que gerem despesa sem provisão em Orçamento de Estado. E o de 2019 foi aprovado, como convinha (e as manobras dilatórias providenciaram), antes da aceitação, discussão e votação da ILC. Mas sobra contrariedade para o Governo e entalanço para os partidos e deputados, que vão ter de cambalhotar nos bastidores antes de saltar para o trapézio. Estou de lugar cativo na plateia.

2. Ao que li, o presidente da Confap terá pedido “bom senso aos professores” para ultrapassar o conflito com o Ministério da Educação, alegando que "a recuperação de parte do tempo de serviço proposta pelo Governo já é maior do que a que se registou noutras profissões". Olhe que não, senhor presidente, olhe que a questão não é de caridade natalícia. É de justiça e é de direito! Leia a lei, quando for ao Ministério da Educação receber o próximo subsídio aproveite para pedir ao ministro, a ele sim, o bom senso que o preocupa e reoriente para as campanhas da Dra. Isabel Jonet a sua visão caridosa da política. De caminho, seria bom que o senhor presidente e todos os pais que capitaneia percebessem que a indignação dos professores tem, inevitavelmente, um impacto grande no clima das escolas onde os vossos filhos crescem e aprendem a ser cidadãos.

3. Não teve o relevo noticioso que a gravidade da situação justificaria, mas a verdade é que o 1º período lectivo se caracterizou por milhares de aulas perdidas, por falta de professores, apesar da chamada “Reserva de Recrutamento” os colocar semanalmente e em grande número. Com efeito, muitos não aceitam as colocações (malgrado as penalizações que daí resultam), as escolas recomeçam a tramitação e os alunos esperam.

Se se analisarem as condições que caracterizam este tipo de trabalho docente precário, percebe-se facilmente que os professores são confrontados com muitos directores sem flexibilidade para construir horários “aceitáveis” e com decisões que não se compaginam com as 48 horas que lhes dão para as tomarem (arranjar escola para os filhos e alojamento bem longe da residência, sem qualquer tipo de apoio suplementar).

Afinal, porque existe este cenário de colocações permanentes? Porque mais de 75% dos professores manifestam sinais de exaustão (conforme foi apurado no recente estudo da Universidade Nova de Lisboa), sinais que são a antecâmara do que a ADSE tornou público em Março transacto: seis mil docentes com baixas médicas superiores a dois meses e cinco mil em mobilidade por doença.

Que resulta de tudo isto? A breve trecho, o aumento do número de alunos em muitas turmas, o aumento das horas extraordinárias para muitos professores e a perda de muitas aulas para muitos alunos, como já foi dito. Mas a médio e longo termos, a situação será gravíssima se a incompetência política persistir na negação das causas e na aceitação de decisões que afastam os cidadãos da profissão. Veja-se, por exemplo, uma entre tantas, a silenciada injustiça tomada contra os docentes contratados com horários lectivos incompletos. Abstendo-se, PSD e CDS/PP aliaram-se objectivamente ao PS para, na AR, chumbarem a proposta que resolveria a decantada questão dos descontos para a Segurança Social, dando mais um forte contributo para o abandono da profissão. Daqui a dias, a partir de Janeiro e ao arrepio do que legalmente está definido, aqueles professores verão como inexistente todo o restante trabalho docente, para efeitos de acesso ao subsídio de desemprego e, posteriormente, à aposentação. Face a isto, ainda há quem se espante e indigne por os professores não aceitarem as colocações?

*Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)

15/12/2018

Mais um inefável relatório da OCDE

Mais um inefável relatório da OCDE
A análise feita na imprensa sobre o Reviews of School Resouces. Portugal 2018, o último relatório da OCDE, fornece, mais uma vez, uma subliminar informação desfavorável aos professores, assente nos seguintes tópicos:
- Retoma do discurso segundo o qual os professores estão bem pagos (a OCDE foi, há meses, confrontada com a discrepância entre registos estatísticos abstractos e a situação concreta, mas não aproveitou este novo documento para se corrigir, favorecendo, assim, o Governo na corrente disputa com os sindicatos). 
- Tese segundo a qual directores e professores manipulam as necessidades educativas dos alunos para reduzir o tamanho das turmas (tese que apoia os esforços do Governo para impor políticas prioritariamente centradas na redução dos custos).
- Lamento por a descentralização (leia-se municipalização) não ter ido mais longe, designadamente acolhendo a contratação e colocação do pessoal docente e a atribuição aos municípios da responsabilidade por todos os assuntos operacionais (tão a propósito para a redução da autonomia das escolas e para a visão do Governo sobre a matéria).

Para tornar mais credíveis estas encomendas, o óbvio acabou igualmente por ser contemplado no relatório: a OCDE recomendou a aposentação antecipada dos professores, sem penalizações, como forma de promover o rejuvenescimento da classe. E para ajudar a compreender a tessitura entre a OCDE e o Governo, permito-me um pequeno exercício de memória:
- Em Janeiro de 2009, no CCB, Sócrates recebeu, duma conceituada perita da OCDE, um entusiástico “bravo”, a premiar as suas políticas. Decorria a apresentação de um relatório que o então primeiro-ministro disse ser da OCDE, o que lhe valeu o qualificativo de mentiroso porque o relatório não era da OCDE. Sócrates apenas aproveitou uma promiscuidade que virou padrão (recorde-se, por exemplo, que o actual secretário de Estado João Costa é consultor do projecto da OCDE Future of Education and Skills 2030): os mesmos peritos, funcionários da OCDE, actuam como consultores independentes, quando lhes encomendam relatórios principescamente pagos. Na altura, tratou-se de um, feito com base em seis dias frenéticos de permanência em Portugal, durante os quais ouviram 58 pessoas (indicadas pelo Governo), participaram em 14 reuniões (preparadas pelo Governo) e visitaram 10 escolas (escolhidas pelo Governo). Que se esperaria, senão um “bravo”, de peritos que se prestaram a legitimar políticas com modelos de análise tão rigorosamente “independentes”?
- A 9.2.18, Andreas Schleicher, director para a Educação da OCDE, foi o animador convidado pelo Governo para encerrar a romaria das loas à flexibilização curricular e ao perfil do aluno do século XXI. Dias antes, a festa tinha começado com duas autoridades nacionais em matéria de Educação: Catarina Furtado e Fernando Santos. Como convinha aos anfitriões, sem ter falado com os docentes portugueses nem deles ter procuração, Schleicher disse que o novo modelo da flexibilidade curricular é a forma como os professores gostariam de dar as suas aulas. Como convinha aos anfitriões, sem ter posto o pé nas salas de aula cá do burgo, teve o atrevimento de falar de uma tensão nelas existente, que a flexibilidade ia resolver. Como convinha aos anfitriões, aplaudiu, no acto, as demonstrações de algumas “aprendizagens significativas”: leitura de rótulos de embalagens e interpretação das razões da ascensão dos balões de S. João. Esta coreografia sucedeu ao relatório da OCDE sobre o Projecto de Autonomia e Flexibilidade Curricular, necessário para credibilizar a generalização de uma experiência que recuperou metodologias falhadas no passado e que, por isso, continuam a não convencer. A suposta componente empírica do relatório foi construída sobre um reduzido número de visitas a escolas dos arredores de Lisboa e a fundamentação teórica retomou as orientações doutrinárias da OCDE sobre a matéria. 
Só ingénuos não divisam as encomendas que subjazem a este tipo de relatórios. Só ingénuos acreditam que mudam as práticas mantendo os protagonistas e a cultura. 
In “Público” de 12.12.18