António Costa disse que quando o ministro da Educação fala é ele que está a falar. Ora quando o António afirma que a recuperação do tempo de serviço dos professores custa 1300 milhões ao ano e o João diz que essas contas estão agora a ser feitas, em qual Costa devemos acreditar? Por outro lado, quando, há dias, o Ministério das Finanças disse que a recuperação custava 331 milhões, fê-lo sem antes ter feito contas?
Quando, na última entrevista ao Jornal das 8 da TVI, António Costa disse não ter sido ele nem um governo dele que congelou a carreira dos professores, apenas jogou com as palavras. Com efeito, era ministro do Governo durante cuja vigência foi determinado o primeiro congelamento da carreira dos professores (Lei 43/2005, de 29/08). Formalmente foi a Assembleia da República. De facto, a AR apenas obedeceu aos ditames de um Governo de maioria absoluta do PS.
Uma negociação séria e um entendimento justo não é um jogo de manipulação da verdade e dos factos.
É sério apontar a “queda” do Conselho Local de Directores como uma cedência, quando se propõe, a seguir, a criação do Conselho de Quadros de Zona Pedagógica, constituído pelos mesmíssimos directores, agora apenas referidos a áreas geográficas diferentes?
É sério anunciar como progresso que os quadros de zona pedagógica passam de dez a 63, diminuindo-lhes a extensão, quando os parágrafos sete e oito do artigo 55º do anteprojecto do DL, que estabelece o novo regime de gestão e recrutamento do pessoal docente, acaba por manter tudo como antes?
É sério o ministro e o primeiro-ministro apregoarem que querem acabar com os professores de “casa às costas”, quando os professores dos quadros de agrupamento, até agora inamovíveis dos seus agrupamentos, passam a poder ser deslocados para qualquer local dentro da sua zona pedagógica, para completarem horas lectivas?
É sério exigir aos que venham a adquirir vínculo que concorram a todo o país no concurso seguinte?
É sério o ministro da Educação dizer que a graduação profissional persiste como indicador universal para colocar professores, quando o normativo que propõe continua a dar mandato aos directores para a ignorarem?
Na peugada da miserável visão estratégica de Maria de Lurdes Rodrigues, de dividir para vencer, foi mais uma vez desastrosa a ideia, do ministro da Educação, de recuperar o tempo de serviço apenas para os professores colocados nos primeiros escalões da carreira. Sempre que João Costa fala, a chama da discórdia aumenta.
É minha convicção que a maioria dos professores actua diarimente ao contrário daquilo em que acredita. Sociologicamente, este comportamento paradoxal explica-se porque os professores foram simplesmente instruídos a fazer de determinado modo e estão condicionados pela propaganda e pelo medo. Sucede, neste quadro, que a sua obediência à autoridade tem limites.
Duas sondagens acabam de mostrar que os portugueses apoiam esmagadoramente a luta dos professores, enquanto o PS cai 9% nas intenções de voto. As continuadas mentiras e iniciativas pouco sérias do Governo para desacreditar a luta dos professores junto da opinião pública falharam.
Todavia, o Governo continua a fugir a uma negociação séria, pelo que é necessário, agora, produzir documentos com propostas de resolução do contencioso, que demonstrem, a par da firmeza, maturidade e sensatez. Do mesmo passo, devem os professores ser protagonistas de iniciativas arrojadas e inéditas, que respondam às tentativas governamentais de anular o direito à greve.
Dou um exemplo: aos serviços mínimos pode responder-se com serviços máximos. Que quero dizer com isto? Recusa absoluta de fazer em casa seja o que for. Permanência integral de 35 horas por semana nas escolas, sendo apenas e só no local de trabalho que os professores passam a cumprir as tarefas a que por lei estão obrigados. Notificação aos directores para que indiquem aos professores os espaços onde passam a preparar lições, corrigir testes e satisfazer todos os compromissos. Fim de utilização dos computadores pessoais e de Internet privada para aceder às plataformas do sistema. Fim de utilização de carro próprio para deslocação entre as escolas do agrupamento. Tudo legal, sem qualquer ónus possível para os professores.
A novilíngua, a do século da paixão de João Costa, o XXI, chama a isto "quiet quitting".
In "Público" de 1.3.23
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